sexta-feira, 11 de março de 2016

O Céu que nos Espera

   Em um piscar de olhos parecem minutos os anos que voam e as promessas que se tornam um rio congelado para escorregar. No fundo da sua mente uma voz é clara, sozinha em um espaço onde ninguém conhece o seu impulso pela morte, a voz incessantemente te chama, profundamente de dentro, por aquilo que é verdadeiro, mas você está cansada dos jogos que todo mundo joga. Seu corpo continua dançando a música da vida, mas você está fora de alcance, observando a rosa se partindo com olhos risonhos e nublados, sempre correndo loucamente como uma criança sem casa enquanto sua chama vagarosamente se apaga. Tão selvagem, livre e longe de todos, você cria seu próprio mundo e vive dentro de uma paisagem, envolvida no mistério da sua fantasia. O anseio pela vida deixa você faminta como uma insaciável ferrugem conduzindo seu sangue, mas no calor da noite você acorda sem saber onde esteve e sem se importar com o gosto das lambidas quentes na ponta da sua língua. Você percebe que tudo parece retornar a partir do ponto onde você parou, mas nada pode ser feito para que tudo venha à tona. Com o tempo você aprende que sempre é tarde demais, pois enquanto o relógio corre o tempo continua deslizando pelas suas mãos sem que você saiba pelo que procura. Essa sensação triste que não pode esconder faz das suas fracas batidas do coração intoxicadas, a linguagem do seu corpo te fazendo querer viver numa pista rápida, e a cada assopro que você dá eu respiro o seu sentimento, a raiva da serpente que rasteja dentro de você, entrelaçada e paralisada pelo combustível do ódio. Quando estou com você, é difícil saber onde estou pisando, pois eu ouço seus pensamentos gritando como um sussurro saindo da sua alma ferida. Sempre que estou há dois passos de você, um minuto se torna precioso, mas sem que eu perceba a escuridão se instala e invade meus nervos, vendo a entrada da sua mente como cortinas que caem para silenciar o público: “observem-me, eu não me importo, olhem a aberração! Eu sinto seus olhos me testando, me julgando, mas vocês não me conhecem, vocês apenas temem a mim. Seus olhos estão manchados com tinta e os buracos das minhas cicatrizes o fazem me julgar pelo que veem.” Ora, alguma vez você já se perguntou se um predador se importa com o que sente a sua presa? O gosto da carne sempre será de medo ou aceitação, mas o verdadeiro teste é o mesmo. Então, é melhor você acordar, pois quando você menos esperar a vida entrará em rigor e uma reviravolta trágica chegará para alterar o seu destino. Esse destino já foi selado no dia em que nascemos, experimentando um pouco de ternura como um maremoto dentro de nossos corpos. Todo esse tempo eu rastejei de joelhos só para chegar até você, e quando fechava meus olhos, eu podia ver uma menina de verdade, escandalosa e contagiosa, atraindo meu deguste com seus risos de açúcar, na graça do que você ama gentilmente por trás desses olhos carentes onde a verdade parecia acontecer e fluir facilmente. Mas quando você permitiu que a sombra da dúvida crescesse sobre sua cabeça, o nosso destino se tornou apenas um sonho de fumaça. Agora eu não sei como te deixar e não sei como ficar, pois nem com todo dinheiro do mundo você poderá comprar o meu amor ou se livrar dele. Apesar disso, eu posso ver através dos seus olhos, essa intensidade que cresce dentro de você para se salvar dolorosamente com a sensação de que eu não estarei mais por perto, por que em algum lugar entre seus sonhos e medos, eu amarrei suas mãos sangrentas para que nunca mais arranhassem sua pele e fizessem o som mais belo que já ouvi. 

segunda-feira, 7 de março de 2016

Obsessão

  Num lamaçal de nuvens bêbadas pelo ouro da manhã, eu acordo sem esquecer o sabor de bílis na língua, vadeando por mais uma maré de pensamentos abismais enquanto meus olhos brilham queimando em vermelho, gotejando lágrimas de mel como uma âncora descendo por um mar prata-doce até suas profundezas íntimas. Através das janelas dos meus olhos e das sombras da minha mente, eu finalmente posso ver essas palavras de ritmo acelerado preenchendo a palma da minha mão – uma concha de dentes que não podem morder – mas que rasgam minhas defesas pelas raízes e exorcizam meus demônios familiares. Sem suportar qualquer som ou aroma exterior, eu continuo esperando de estômago vazio por algo que nunca saberei o que é, mas que me atormenta desde que você roubou meu coração. Eu vendi minha alma para estar com você, acendendo minha escuridão com a luz diabólica e aliviando minha dor com um punhal cego: uma linha vermelha prestes a perder o controle e rasgar-me ao meio para possuir meu corpo por inteiro. Agora eu estou sozinho no escuro como um banquete infestado de moscas sem ninguém para comê-lo, cercado por esse abraço frio de ciúme e levado pelos ventos caóticos da tristeza, com olhos que refletem a sensação de um coração inquieto enquanto meu pulmão fuma nuvens de sonhos esvaídos. Todos os dias eu acordo em um quarto silencioso onde as sombras ainda sussurram memórias com você. Em ascensão pelo nosso beijo, você me prometeu o céu, mas naquele dia eu apenas via céus vermelhos de sangue, uma mentira tão nítida em seus olhos que eu aceitei como verdade, abrindo um buraco no meu peito através de dias solitários e noites intermináveis, acreditando que um dia você retornaria para me assombrar com seu amor e me escravizar com seu desejo. Havia um sentimento que não podia explicar e que ninguém jamais poderá entender, pois você é simplesmente a saudade do ontem. Você ainda precisa que meu coração sangre mais para ficar satisfeita? Mostrando-se sem nenhuma piedade, uma apetitosa insaciável pelo coração que sempre rasgou aos pedaços, jogando suas cartas no lixo e, acima da sua cama, sentindo o cheiro da sua mordida venenosa. Rindo de nada, você se tornou tão indiferente quanto a sombra que te olha ofuscante, pois não há ninguém lá: a escuridão escondida na sua mente e a sombra que caminha ao seu lado são a mesma pessoa, pois na sondagem da noite eu te observo e não vejo nada além de um corpo perambulando sem alma. É uma mensagem de deus ou apenas o destino guiando você para o epitáfio? Estenda sua mão para tocar o meu rosto, pois a hora mais negra da meia-noite cresce de perto, pintando os céus com a cor de nossas sombras. Você pode ouvir o meu aviso? Eu estou levando você para o lugar onde reside o segredo da existência, mas a pomba nunca é gratuita. O conhecimento secreto esconde uma viúva negra e cruel, disfarçando suas verdadeiras intenções e alimentando-se do seu coração faminto, até que você implore pela morte. Portanto, dê-me a sua liberdade, e eu lhe darei a passagem para fugir desse mundo, mas mão tema a lâmina da ceifeira, pois a morte é somente o princípio das dores. Por muito tempo a humanidade deixou seus poderes adormecidos, poderes estes que nos assombrariam, mas que revolucionariam nossas vidas. Nos tempos antigos os magos eram considerados grandes iniciados capazes de desenvolver suas faculdades internas para obterem o domínio sobre a natureza, e se voltarmos ainda mais no tempo, veremos que no princípio o próprio criador nos demonstrou esse poder quando declarou: “haja luz”, e houve luz. O homem é a imagem verdadeira de deus, e portanto ele foi criado segundo o retrato do universo. Sendo assim, nós somos deuses nascidos do pensamento divino: quando seus desejos nascem dentro de você, o universo responde a eles, bastando que você acredite para materializá-los. Para conseguir o que você quer, você precisa desejar, sentir o seu desejo e meditar acreditando no que desejou, por que aquele que dúvida da sua fé perde a conexão com a fonte primordial como um bloqueio para que seus desejos nunca se realizem. Esta criação deliberada e consciente é a capacidade que lhe foi dada para materializar as coisas, porém nada é criado sem um nome, e por isso a maioria das pessoas não enxergam suas próprias criações. Em vez disso, são suas crenças que controlam o que podem enxergar, enquanto o limite de suas imaginações é uma fronteira criada por suas mentes ignorantes. O que nós imaginamos é o que criamos fisicamente. Em outras palavras, você tem o poder de mudar a sua realidade com pensamentos, palavras e sentimentos, pois o pensamento que te traz emoção é manifestado rapidamente em sua experiência. Jesus, o primogênito de deus, disse: “se tu podes crer, tudo é possível ao que crê”. Crer é focar sua mente, com seus sentimentos, em alguma coisa. É concentrar-se em um pensamento e pôr energia nisso, sentir e depois agir, pois “a fé sem obras é morta”. É assim que você cria. Nós somos criadores magistrais e viemos para este mundo físico para expandir e experimentar o todo em extrema vontade, sem a manipulação religiosa que colocaram em nossas cabeças que se sentir como centro do universo é sacrilégio, heresia e pecado. O que você pensa, você cria, o que você sente, você atrai, e o que você acredita, torna-se realidade. O inexistente é apenas o que não desejamos o suficiente. Em nossos pensamentos, nós fazemos o nosso mundo, porém, a humanidade ao enxergar apenas a falsa realidade se deixou seduzir pelos sentidos. Alguns chamam esta falsa realidade de matrix, mas a verdade é que nossos sentidos são limitados e somos enganados pelo que vemos como sólido e imutável. Nossos espíritos nasceram do princípio etérico e dos elementos nossos corpos astrais e carnais foram criados, portanto somos feitos de energia incansável. Energia é a habilidade de produzir um efeito. Então, nossos sentimentos são energia, nossos pensamentos são energia, nossa vitalidade é energia. E tudo que manipula ou altera as energias é chamado de magia. Entenda este mistério e verá que a magia é uma ciência divina que nos ensina a conhecer e utilizar as leis universais. Durante a minha estranha vida esta foi a obsessão que corroeu os meus ossos, e apesar de ter trilhado um caminho obscuro, ainda pude arrancar um pedaço do coração divino e comer do seu fruto proibido. Se olhar para cima e depois para si mesma, verá que você é o reflexo de tudo o que vê. Essa harmonia que tanto almeja pode ser sentida quando perceber que você faz parte dela. Amanhã você pode acordar e viver como uma filha da luz ou pode continuar dormindo e morrer como uma filha das trevas, apenas lembre-se que o único verdadeiro milagre mais importante do que multiplicar pães ou caminhar sem tocar o solo, é a decisão independente de evoluir e despertar com a purificação das suas emoções e pensamentos para alcançar a plenitude com deus, pois assim como uma faca normalmente só deve ser utilizada para cortar o pão, nas mãos de um assassino pode transformar-se numa arma mortal.

sábado, 27 de fevereiro de 2016

Transcendência

    Através dos limites do céu um silêncio cresce, olhos refletindo as trevas permanentes do universo e ouvindo apenas o som indefinível que voa sobre nossas cabeças como um sopro direto na alma cruzando corpos invisíveis. Com todas essas notas livres no ar, as mentiras queimam na terra, elas vem para nos fazer voltar à realidade enquanto no alto uma voz continua rindo: a cabeça que bate como um louco percorrendo seu caminho entre o poder e a rejeição. Como decibéis sorrindo quando a única música são os raios do sol, essa canção de triunfo ilumina nossos corações, sempre tentados a crescer e capturar o momento mais forte da esperança, sem compreender a razão de ainda continuarmos vivos. Nossos batimentos continuam soando através do ar e juntando-se aos rios como vidros se despedaçando em sintonia com a harmoniosa natureza. A chama do amor paira sobre toda humanidade, um presente divino se estendendo como uma serpente de veludo rastejando entre nossos espíritos, mas que não conseguimos sentir com estes corpos frios e cansados. Nós reagimos como uma criança temperamental, sem saber o que está reservado para nós, e – para fora do limbo – o nosso isolamento, vagueando entre mil milhas de segredos e pecados que arrancam nossas peles e escancaram nossos esqueletos, sem a fina camada que esconde quem realmente somos. Quando os ventos solitários sopram, é um sinal para fazer a mudança, palavras claras como nuvens dizendo para não permanecermos os mesmos, mas é tarde demais para fazer o relógio nos levar de volta para longe desse mundo congelado por orgulho. Portanto, eu tenho que fazer o meu próprio tempo e, com minhas mãos, salvá-la desse limbo, em seguida, dar-lhe um empurrão para fora de toda essa vergonha como uma alma jovem olhando para o éden sucumbido na esperança de ver o que o amor realmente significa. Quando outro amanhecer vem, o mal invade nossos corações como névoas de sangue, todas essas palavras sutis se encaixando perfeitamente para mostrar que o homem sempre precisa de um vício, mas que parece ser sempre a mesma velha história. Eu sabia que o tempo todo eu era uma mentira e que o que eu via no espelho era uma mente controlada, pois para sermos lapidados e levados para o lugar onde se move a ranhura, é preciso sempre morrer no dia seguinte, voltar de novo e fazê-lo um pouco mais, contanto que esta seja a nossa verdadeira vontade, isto é, a vontade de deus. Nessas linhas de louco, parece que estamos sempre de pé em nossas mentes, conscientes de quem somos, mas inconscientes do que temos que fazer para sermos salvos. Você diz que as leis estão ficando mais difíceis de obedecer, mas você já se perguntou o que acontece com o mundo quando uma única regra é quebrada? Olhe ao seu redor, as nuvens rolam uma por uma, e as formas parecem enunciar cautela, mas dentro do seu crânio tudo parece simples, quando percebe a velocidade que você percorreu, acaba se vendo no mesmo lugar e repetindo os mesmos erros. Mas não se preocupe, a mente consciente não te deixaria ir mais além. Amarrada e amordaçada, você está em um reino de escravos, onde a complacência de todos traz a forte necessidade de banhar-se no fel, assistindo os vermes se banquetearem com seus cadáveres apodrecidos e suas almas vendidas. Então, os corpos são arrastados nus para um lago frio e azul, onde a noite é especial, e todas as almas são arrebatadas para o purgatório. Eu vejo o meu verdadeiro eu flutuando para o espaço e colocando esses braços para descansar, minha verdadeira vontade acabando... no clarão hediondo, eu finalmente me tornarei um ser imortal? Eu sinto meu corpo deslizar para um lugar que eu preciso estar, ouvindo vozes familiares chorando meu nome, e lá eu vou, passeando com cada cicatriz à mostra no último trem para casa. Quando o sino final é tocado e o jogo se encerra, nós falamos as palavras de despedida com um poço vazio dentro do peito, pois não é sentindo o aguilhão da dor que se pode apagar a mancha de uma maldição. A ser eu a revelar essa verdade para você, eu sei que você entenderá os meus sinais, mas como uma situação absurda que tem apenas uma saída, você prefere fechar os olhos e voltar a cair no chão, esperando que o vento pare de falar enquanto o impacto não faz nenhum som.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Um Sonho de Inverno

Sensual carta anônima

“Amada minha,
É sempre tarde da noite quando penso em você, num momento antes do sono, imaginá-la transforma minha noite em dia e tristeza em corações mornos.
Em minha pele eu sinto sua respiração, muito frio para viver no amanhã, você se torna uma rosa cinzenta congelada, esfriando todos que passam por você como um hálito que congela corpos e mentes cansadas, muito dormente para sentir sua presença semelhante ao toque da neve.
Você não pode sentir este surreal e inacabado desejo sangrando em seu coração, por que antes de lembrar-se do seu jeito quente e cruel, profundamente como um sonho dos seus lábios se movendo para criar uma música sem lamentos, você se esquece de abastecer sua fogueira de esperanças quando sua luxúria é perdida em angústia.
Para os outros você permite que sua falsa luz brilhe como um sol negro escondendo o amanhã, esperando que suas palavras de consolo lhe puxem de volta antes que o rio da escuridão a cubra, mas enquanto você chora, os ventos negros sopram e um destino negro cresce, trazendo noturnos sentimentos que alisam sua inofensiva desgraça para saciá-la com um futuro incerto.
Congelando ao seu lado, eu não vim aqui para mudar seus pensamentos, pois seus olhos ficaram brancos e cegos e a luz está desaparecendo muito rápido, ainda assim, você precisa recuperar suas memórias das cinzas, onde em algum lugar você se deixou para trás queimando...
Você não entende o que está acontecendo?
Você tem a bondade de um tolo e a beleza de uma virgem, tem o ouro que necessita e está sempre implorando por mais, mas quem precisa amadurecer não são aqueles que seguem a sua brisa.
Olhe para mim: eu falsifico meu nome com um pouco de assombração para deixar escorrer pelos meus dedos o veneno que afasta as pessoas do meu coração indiferente, mas eu não estou fugindo de quem eu sou, estou afastando as pessoas daquilo que eu não sou.
O pior até agora foi nunca ter conseguido obter o seu perdão, e espero que um dia você entenda que tudo que fiz foi por amor, quando suas rotas desertas forem esmagadas por algo irracional.
Eu sou o sentimento que transforma seu corpo em pecado, sou uma saída para tudo que você teme, sou a alma presa em suas mãos.
Na escuridão, não há luz, no pôr-do-sol, não há nascer do sol, mas quando há eu e você, as trevas e a luz se fundem como mãos dadas que nunca se desprendem.
Em seus braços é tão fácil fazer amor, quando a noite vem e o vento captura nossos corações apaixonados, nós dançamos até que nossos corpos débeis virem neve derretida.”

sábado, 30 de janeiro de 2016

Um Sonho de Primavera

   Olhando pela janela, pequenos monstros manchados com fuligem rastejam para dentro do meu quarto. Esses monstros são meus medos dançando na escuridão com pequenas mãos e pequenos rostos me assistindo. Em todos os lugares que vou, eles me ensinam a ser puro em pensamento, palavra e ação, não importa quando, onde ou com quem, tudo o que eu já fiz ou faço, são meus medos que me guiam. Então eu olho para trás na minha vida sempre com um sentimento de vergonha por tudo que fiz ou deixei de fazer, sempre virando uma folha nova, em seguida, rasgando-se através dela. Os sons de ontem ainda ecoam na minha cabeça, conflitos distantes sem solução, de quando eu era jovem no amor e a felicidade me procurou. Eu vejo meus anjos presos sob o gelo e estranhos na minha cama à noite: o céu nublado encobrindo os sentimentos enterrados no escuro. A noite é silenciosa em minhas mãos, e a tristeza sussurra suas condolências, estendendo-se ao longo da minha alma como orações mergulhadas em um fogo negro. Esta é a razão pela qual, tempos depois, um vento soprou de uma nuvem esfriando minha fé, mas para encerrá-la em um sepulcro seria preciso matar você, pois assim como a lua brilha sem trazer-me sonhos ou as estrelas nascem com olhos para me observar, nada pode me separar do amor que sinto por você. Minha intenção é um estranho momento à parte do mundo que dividimos, e todos nossos devaneios encantadores passeiam por esse momento, onde as palavras soam confusas e o ritmo fraco repete os mesmos versos, dormindo um milhão de noites debaixo dos mesmos vislumbres que dividem a linha da realidade. Levante-se e olhe no espelho, você vai perceber o quão tranquila é por não fazer nem um som. Olhe para sua vida, quem você quer ser antes de morrer? Quem deseja ver antes do último suspiro? E me conte o que realmente importa, se é o dinheiro e a fama ou quantas pessoas eventualmente podem saber o seu nome? Algumas pessoas chamam isso de carma, outras de destino, mas eu sempre continuo esperando que o tempo mostre o que realmente é, pois esses pensamentos mortais nos prendem e nos algemam em algo que não podemos fugir. Esta noite eu lhe contarei um segredo, então preste muita atenção, não nas minhas palavras, mas na minha voz. Onde a luz brilha um pouco mais forte, onde as sombras dançam nas paredes ou onde os santos homens escondem seus segredos, o sagrado da vida é vendido, mas nunca perdido. Estando debaixo do ouro e da prata a procissão nasce, porém a verdade prossegue como um rio interminável – esta é uma simulação perfeita do que eu quero lhe dizer. Como um homem que enxerga o vale e finge bebericar seu próprio sangue para que se sinta mais forte, assim eu consigo juntar um pouco aqui e ali para formar o muito, acreditando que tudo me pertence, mas esse silêncio ainda consome a ponta dos meus dedos, todas aquelas cartas submissas sem resposta como lábios que rezam em silêncio. Cada palavra soa sua promessa vazia, embora persistente, pois enquanto o tempo se esvai num sonho estilhaçado e o silêncio substitui o som do riso, num sopro de hesitação, minha vida dura apenas um momento antes da sua ida. Assim meu coração dorme em sua ausência, fazendo dos meus olhos templos congelados como conchas secas respirando um amor esquecido. Eu danço vagarosamente na elegante poesia de suas asseclas rimas frágeis, implorando por conforto em um verso inadequado, para desconsiderar coisas que sinto quando me afundo na auto-piedade. A tristeza canta seus cantos, lágrimas ajustando as frestas dos olhos para manter a luz, mas este lugar está gritando o vazio desde que meu sangue e suor se tornaram água lamacenta. Eu me aventurei no submundo para provar que esse amor é verdadeiro, ouvindo uma voz focalizada me chamar de volta aos sacrifícios da luz e ousar uma mudança de padrões internos para provar a sabedoria da divindade e o horror da sua picada. Mas tudo tem seu preço: as silhuetas do pecado sempre se oferecem sem cobrar nada, ecoando o mistério de uma teia viciosa que corrompe todos que a tocam, essa chuva deslizando sobre nós... você consegue sentir? Caindo em nossas cabeças como uma memória, andando exposta ao vento, falando como amantes falam, fazendo nossos corações baterem como beijos de saudade. Quão perto ou quão distante estamos um do outro para saber que nada pode ser substituído? Aquelas escolhas que antes pareciam ter tanto significado agora se mostram apenas ilusões em nossa direção como faróis se aproximando para se apagar num lampejo silencioso. Ainda assim, eu me pergunto, será que perdemos algo ao longo do caminho? Um sorriso, uma palavra não dita, um segundo beijo? Eu só peço que você se lembre num pensamento de vigília o que realmente significou nosso amor verdadeiro, antes de retornar ao sono e cair em um sonho infinito.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Xeque-mate

   Como línguas flamejantes secando as lágrimas traídas pela luz da manhã, eu olho fixamente o céu de um ano que se passou lentamente enquanto meu corpo inerte agarrava-se a ilusões e mentiras. Esperando pela serenata e vagando por um jardim de fantasmas silenciosos, de mãos dadas com a canção do tempo, a pintura do mundo se torna apenas uma mancha escura e borrada, alimentando os escravos com suas doutrinas demoníacas e tradições que nada mais são do que o espelho de suas imaginações devassas.  Eu sinto algo transbordando em meus olhos como uma neve que nunca desvanece, momentaneamente tentado a mudar ou alterar os fluxos dimensionais dessa realidade, eu caminho por entre pessoas depravadas como vultos de rostos rindo na minha cara. Elas empalidecem de alguma forma e gritam hipnotizadas como marionetes quebradas cultivando uma razão enfadonha interiormente, mas a doença se espalha muito antes que possam enxergar aquilo em que se tornaram, pois o veneno é passado de uma geração para a próxima. Rastejando em minha cama para fugir dessas teias desarmoniosas, eu percebo que sou apenas um frágil peão prosseguindo em um jogo celeste, vendo pessoas dormindo dentro de um sonho de pintor enquanto nos mantém na linha como guerreiros preparados para morrer numa batalha mortal. Mas, contra quem estamos lutando? O que é a escolha para o escolhido? Nossas almas se dividem e lutam através de pensamentos que transcendem o tempo, porém o roteiro já foi escrito, então pacientemente nós esperamos por um amanhã que está mais distante do que os anos que nossos corpos sobrevivem. Assim, sabendo que o futuro é a morte, o que significam nossas orações? Do outro lado do tabuleiro, o jogo do diabo se arrasta na escuridão, onde demônios brincam vestidos de bispos e cavaleiros esmagam a humanidade com peste, guerra, fome e morte. O horror se torna a dor de um só fôlego suspirando por salvação, mas o ar está cheio de pretensão, a esperança se desfaz como um retrato velho desvanecendo ou como uma noite sem sono em uma casa vazia esperando por alguém para reescrever o sentido da vida. De repente, o tempo para com a imagem de uma árvore nua apaixonada pelo inverno, seus galhos secos abraçam o vento e impedem que seu coração se congele no vazio, pois se não houvesse toda sua individualidade, então isso não dava significado para sua existência. A árvore mostra que tristeza e alegria são duas palavras, mas apenas um nome, por que a polaridade de suas estações é o que realmente importa. Sendo assim, a verdade está muito além daquilo que somos condicionados a crer? Eu penso que o mundo poderia acabar hoje e todas as coisas que eu poderia obter dele com minhas ambições e desejos do meu coração em busca de um sentido real para minha existência, ainda não seria o bastante. Parece que as coisas que eu posso ter apenas para silenciar meus pensamentos e consumir a dor não me fazem ganhar nada além de poeira nos olhos. A verdade é que sou eu quem diz onde estão meus limites e onde é que eu devo parar, sentindo toda essa perfuração ameaçadora fechando meus olhos para a escuridão do mundo, imaginando que tudo se foi e que tudo a minha volta é apenas um sonho dividindo meus pensamentos enquanto escorrego para a loucura. Eu não consigo vencer esse jogo, nem parar estas palavras dolorosas, pois o chão está se abrindo sob meus pés e estou caindo no abismo da descrença. Eu sinto as palavras de deus rasgando minha mente, porém não consigo ouvi-las, tremendo de frio sem nada para segurar, eu carrego um aperto que desconheço, sabendo que algo está muito errado... estou nu entre esplendores vidros vazios, refletindo um pacto silencioso tão conveniente e fora de vista, onde a única coisa da qual estou certo é de minha vontade em alcançar a evolução como uma criança enternecendo num sorriso eterno.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

A Dança Secreta da Chuva

    Como insetos perambulando de noite uma voz acolhedora arremeda para dentro da minha mente, confrontando minhas defesas e julgando o que restou de mim a medita que me faz ver além das minhas recordações persistentes. Quando o sino começa a soar, eu ainda estou dentro da minha cela, refletindo sobre meu passado e dando uma olhada através de um mundo que não deu certo para mim. Eu não posso desafiar isso e também não posso negar, pois meus devaneios internos torturam-me enquanto essas asas se agitam na orla da minha sanidade, espreitando palavras de um velho mundo contra a parede da raiva que corrompe meu pensamento. Enquanto ando, toda minha vida passa diante de mim, minha alma sente que seu momento está chegando, mas as palavras me escapam quando tento falar, a vida lá embaixo parece ser apenas uma ilusão estranha. Eu vejo uma lua vermelha com seu perfume frio preenchendo minha respiração, um doce sangue que desce pela minha garganta e inflama meus membros, me desintegrando como corações cansados ladrilhando no caminho dos mortos num silêncio taciturno e lambendo as feridas de um coral de almas ásperas enterradas num campo abundante sempre-verde com árvores venenosas e profundas ravinas soltas forjando o calor da noite, encobrindo as luzes com manchas escuras que se espalham pelo chão – uma piscina escura sob meus pés – enquanto ouço o cântico fúnebre das estrelas: versos roxos como um ataúde funeral uivando através das minhas veias. Com palavras rabiscadas que caem como cacos de vidros para depois se unirem, eu percebo que às vezes tenho que apertar a mão que me alimenta, isto é, aquilo que me dá forças para seguir em frente. A escuridão colocou suas garras pintadas sobre mim novamente, mas a verdade por trás das minhas fantasias mais profundas é como um feitiço perverso que prende meu coração: a esperança que me faz enxergar lá fora mesmo olhando de dentro da sepultura, concedendo meu perdão à mulher que amei para voltar de volta à vida. Em um céu escurecido, o riso do dia cai rapidamente noite adentro, e seus braços macios me puxam de volta para cima, eu me agarro ao sussurro do vento que me leva as feições naturais do seu rosto, tentando adornar a forma proibida dos seus lábios, mas flutuando sobre os vales sossegados da sua mente, eu não percebo seus olhos tão abatidos, sentindo a dor de quando seus pulsos são cortados para ocupar meu lugar embaixo da terra. Nua em meu túmulo, seus olhos escuros de licor ainda me encaram, sonhando com o poder fascinante dos meus braços quando dançávamos naqueles dias dourados e éramos como sussurros perdidos na grama ardente, as lanternas do pôr-do-sol nos perseguiam como sombras correndo da luz e o brilho ofuscante da paixão nos cegava, cujas flechas tinham fome de carne e o veneno do amor nunca era raciocinado. Algo que se passava por nossos anseios nos fazia beber do vinho da ilusão que descia como névoa espessa por nossos corpos, sonhos de casamento emoldurando nossas visões futuras, embora os sinos das igrejas ressonassem como o dia do julgamento. Da graça eu me apaixonei por você, perfumada como uma traiçoeira isca de olhos silvestres, suas fantasias eram carregadas de impureza, seu beijo gelado fervia meu pescoço como ondas murmurantes se deitando na praia, derretendo meu desejo no que aquece a impecável beleza do seu rosto constrangido em um pálido alvor de inércia... eu ouvia um redemoinho de vozes doces que saiam dos seus lábios frágeis, tão sossegada quanto nossas carícias invisíveis, você não se via cair no estreito precipício do abismo carnal, pois de alguma forma nós nos esquecíamos de como procurar um ao outro, deixando que o hábito obscurecesse a visão letárgica que sufocava nossos sentidos e nos fazia esquecer-se do puro êxtase do amor que expirava de nossas peles quando estávamos bêbados com o perfume da noite. O novembro chegou lentamente como chuvas atrasadas de inverno, mas há tempos eu já vivia nele muito antes de te conhecer, esperando por esse momento para dizer que não importa quão depressa ou quão longe você esteja, eu sempre estarei com você, pois eu sou o sonho não vivido e a saudade que te persegue, a dor entre suas pernas e o grito na sua cabeça... no veludo ao redor do seu corpo, eu ainda sinto o volume dos seus cabelos me cobrindo, na ira ou na fraqueza do seu coração, eu sou as trevas na qual você é protegida, e por todas as pessoas que nos abandonaram, nós estaremos juntos para que o sol e a lua se beijem num eclipse eterno, por que na sombra da sua luz eu me escondo de longe, amando você a distância como chuvas mornas regando uma flor solitária dançando no abrigo de suas próprias pétalas. 

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Prelúdio Inditoso

    Numa tarde cinzenta as palavras não faladas caem como chuvas macias encharcando uma cama de mentiras para todos verem, a transparência se espalha e nada mais é ocultado, pois em silêncio uma loucura frívola releva o veneno de suas mandíbulas. O vento traz constantes calafrios e a lua irradia sua imagem mais bonita da luz, numa beleza estonteante e poética, de alguma forma me conforta quando o dia se vai, lembrando-me sem nenhum motivo de belas flores mortas ao sol enquanto meu corpo voa para cima sem entender por que os outros não podem ver. Esvaziado de qualquer sentimento, a verdade vem como uma canção de ninar aos meus ouvidos, despejando brilhos e recordações que florescem de todo meu ser como lentos movimentos de luz seguindo o curso do entardecer, um caminho sem volta e contagioso, emanando a energia daqueles hipnotizados pela chaga escondida através de uma morte indolor. Coisas que eu pensei terem sido postas para trás, se conectam profundamente com as minhas emoções, uma ligação tão profunda que enlaça meus pensamentos numa realidade descarada, cada momento, cada sussurro, cada traço escondido pelo vento gélido da minha pele, cada silhueta que meu olhar deixou passar despercebido e cada lugar que meus dedos tocaram... eu fecho os olhos, assim o mundo não pode me ver, mas minha mente me trai e confessa minha cegueira, esperando pela minha cadeia diária – aquela que me espera pacientemente todos os dias – correndo tão longe para chegar ao mesmo lugar, sentindo todo o desperdício corroendo minhas entranhas, enchendo meus pulmões com todas as lágrimas que eu não chorei, com todas as ruínas da minha alma quando os retratos do meu passado me engaiolaram em uma pintura de culpa, vendo faces quebradas no chão, aquelas máscaras que não servem mais. Agora eu me vejo em um mundo de raiva e espada, além do sono e do que é real, eu encaro a verdade mentida lá fora através do que as árvores escondem em suas sombras, ouvindo uma voz que não sabe para onde quer ser guiada, um som que flutua sob suaves brisas geladas e flui em serenas nuvens chorosas enquanto o sol ainda está dormindo, mas quando o dia clareia, eu me escondo dos espelhos para não ver a nítida luz que me seda completamente acordado para encurtar o dia. Como páginas a queimar, eu atento minha sorte para baixo dos joelhos, uma prece de costas contra a parede quando o caçador se torna a presa, lembrando-me de quem eu realmente sou num naufrágio dentro da piscina de éter onde todo meu ser é lavado, rasgando o mundo... palavra por palavra, como fumaça que enche o quarto e logo traz uma melancolia pesada. Esta brevidade de respiração entre nascimento e sepultura é como uma mancha cromática escalando as veias do meu coração, atravessando meu medo mudo e desconhecido com esperanças agonizantes de um dia melhor, essa guerra silenciosa que me fixa no círculo vicioso do ódio: olhos mortos que já não veem o futuro, um alvo inútil para feder no desespero manchando a estrada que anda até seu abrigo no inferno... e me faz perguntar... onde está você, ó minha alma? Onde está você, ó minha amada? Ambas vendidas e despedaçadas, sufocando-me numa agonia espiritual que eu poderia escolher não ver, mas se curvando e adorando o altar da vergonha, a fraqueza humana encarnou em meu corpo, alimentando o medo da própria vida sem entender as psico-portas trancadas que sucumbem minha mente, a besta que respira fogo e liberdade e explode-me com pensamentos negros, me devorando num vórtice em espiral, então eu percebo que o meu pior inimigo vive no meu interior, lambendo minha carne e rindo de mim, dizendo: “você é fraco e não pode me matar, pois estou vivendo dentro de você. Eu venho a você todas as noites e sou seu subconsciente obscuro, aquele que o mantém acordado”. Ele tece uma rede de mentiras e numa concha vazia apodrece a fachada da minha vida, fazendo correr pelos meus dedos essa energia escura que bebe meu sangue até tornar-se negro, e no final do arco-íris da minha essência encontrar o amargo mundo da perdição e da loucura. A véspera da alma assassina me possuir está chegando, e montados em cima de chamas, nós entraremos no inferno onde reside o mal apaixonado, amar se tornará ódio e calor se tornará gelo, não haverá mais nada entre o meu pecado mortal e você, ó bela face da morte, abrace-me e beije-me, e eu me esticarei para alcançá-la, pois quando o amor morre, tão sozinho... na multidão, ele ecoa num esquecimento eterno.

domingo, 11 de outubro de 2015

A Morte da Aurora

    Num pomar abatido uma flor murcha dormindo se espalha por uma brisa suave de ventos cansados, suas pétalas se desvanecem em sombrios fluxos de prata como um retrato abandonado vestindo as cores da perda. Numa tragédia pintada eu me maravilho de olhos vazios, vendo este lúgubre estado mental da minha alma aflita engolindo o seu pesar, onde flores morrem em suas horas mais exaustas e são cobertas pelo desespero cinzento da morte fria e branca. Entoante como os ares silenciosos da noite, eu ouço um eco delicadamente sussurrando o seu nome, um vislumbre final do seu sorriso com características de alguma forma familiar, num corpo ferido e uma mente despedaçada, gritando sem fazer ruído sobre memórias que se deitam nuas e tristes numa selvageria de fragmentos dominando um corpo de mentiras e pecados. A luz do dia é deixada com um grande adeus, a radiação de uma derrota amarga entrando em profundo colapso com os espinhos que crescem em seu ventre cercado por cortinas negras, cores agonizantes desfazendo o sorriso da sua boca com um beijo congelante, roubando os lagos verdes dos seus olhos com toda a sua inocência: o medo da morte ou da podridão que se espalha pelo seu interior desabrochando. O que você tem de mais precioso... sua beleza decadente, os lábios cor de rosa, a pele de ouro branco, para mim são como tons de um paraíso esquecido, escondendo uma alma feia com flores envenenadas para sua presa. Você destruiu nosso destino com o seu orgulho e preconceito, e às vezes eu me pergunto se você apenas não ansiava por um beijo mortífero, querendo escapar do fardo que te assola para se estender um pouco mais por um momento de paz, desamparada e exausta de perseguir a sua própria luz estranha, eu percebo que você era como uma imaginação ausente me empurrando por estradas e rios para no fim enxergar que nada é como parece ser. Como o sol que nasce e cai, o tempo nunca significou nada para mim, mas percebo que perdi muitos anos perseguindo a sua canção, enfeitiçado pelas águas mornas e verdes dos seus olhos, não notei quando fui lançado para fora da sua carapaça morta. Você nunca conseguiu ver seus traços em muitos rostos? Nunca sentiu-se menor do que a vida tem a oferecer? Por que eu não podia estar lá, para receber mais um lindo dia e provar o doce mel da vida, sorrindo para tudo o que foi concedido a nós? Eu sei que essas perguntas nunca serão respondidas, pois agora eu me deito sobre seu cadáver frio... seus olhos estão secos e negros por dentro, com fungos de gelo acariciando sua testa, o granito toca sua pele onde as veias estão se fechando e roubando o calor, seu corpo deforma-se como dedos debaixo d’água... este é o seu fim, intensa aurora, mas o fato dessa sensação não ter um nome, não muda o que sinto por você. Com um olho fechado para antecipar o seu medo, você deverá sentir o punhal da sombra lhe trespassar com a dor mais doce das hereges do silêncio, e com olhos roxos eu assistirei você sofrer até que o seu sucesso tenha evaporado. O nosso elo espiritual será selado, e com pesadelos você sentirá isto corroer sua alma como vermes insaciáveis se fartando com o seu sangue, todos os demônios que te assombram retornarão para congelarem sua pele pálida com um último beijo eterno. Atrás dos feixes ensolarados que te fazem aparecer, era uma vez um sorriso enterrado debaixo de uma máscara sem vida, escondendo seus destroços incapazes de ver o próprio amanhã destinado a desaparecer.

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Onde quer que Você Esteja

    Lá embaixo, no conforto dos estranhos, uma figura sem forma esconde seu rosto entre frascos de memórias perdidas. Dentro de seus olhos os dias passam como um furacão a perseguindo debaixo da terra, acordando com o som da chuva e vivendo entre granizos de uma pele clara, ela vagueia no ar frio da neblina e numa montanha se senta, não de ouro, mas de pecados, pois enquanto vende seus segredos ela sabe que nunca foram conhecidos. Suas promessas são mentiras, sua honestidade como as costas que escondem uma faca. Um poder oculto ela esconde, mas por dentro um estranho mundo elástico se estende, murmurando suavemente abaixo das gotas minúsculas que caem do véu do seu passado o lado que ela mantém apesar de todos os outros. Tomada em pensamentos e habituada a se importar, com roupas de baixo ela sai pela varanda para clarear a mente, tão faminta por oxigênio, observa as tremulas folhas e luzes interrompidas da inconstante luz da manhã, mas não demora muito para começar a assistir o farol escurecer, sentindo o vento de uma vespa soprar entre cada luz presa do seu olho ou em cada poste que costumava colocar sua fé, onde todos os olhos cinza no metrô diziam que ela simplesmente não existia. Quando eu a vi da janela, fui guiado a atravessá-la como uma adaga flutuante direto em seu coração, vendo suas esperanças derreterem como cubos de gelo no oceano, mas pouco antes de seu corpo se dissolver, eu escureci o sol, para que o jardim voltasse a crescer por ele mesmo. Você é esse jardim e este é o seu dia, aqueça suas mãos e deixe-me saber se você está pronta para me receber, pois minhas palavras não são algo que você toma, mas algo que lhe é dado como uma poção venenosa: você deve beber o que é limpo e cuspir o que é sujo. Não há medição além disto e nada além disto é amor, pois o calor solene que você sente por dentro é o mesmo que corre em minhas veias, desde que não tenhamos tempo nem mente para entender como versos infantis dão sentido a nossas vidas. Quando as linhas de nossas pipas se cruzarem ou a casca de nossos corpos não suportarem a silhueta do nosso interior, ainda assim desejarei sentir o perfume da sua pele ou o frio de uma brisa temperada pela grama úmida emanando seu cheiro, doce como uma canção sussurrada pela sua voz e flutuante como frágeis pétalas de um sonho me levando às nuances do seu sangue brilhando... quando secretamente lhe enviei uma parte do meu fôlego. Veja, o futuro está chamando e eu sou a sua resposta, salte de um livro, pois você não é obrigada a engolir tudo o que você despreza. Esses urubus desarrependidos querem sua vida, encurralando você por um desejo natural enquanto as coisas que te atormentam fazem fila para te assombrar. Entre um milhão de chamas você conseguirá se lembrar de um momento em que a chave da sua vida correu livre entre seus dedos? Você tem dito que o tempo nunca irá enxaguar todas as feridas, mas eu sei que o gosto pelo seu passado está enfraquecendo e que onde quer que você esteja eu irei te resgatar. Seu coração nunca mais será um lugar escuro e sozinho, leva um tempo, mas podemos entender essa coisa, e transformar de volta em como era.

Cronologia