quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Mate-me de Prazer

    As luzes da cidade desaparecem e o céu negro se torna claro, pequenas e brilhantes luzes congeladas que piscam para os amantes das trevas. Planando em direção às sombras, eles são capturados pelo silêncio de um som aproximando-se, um silêncio de paz entre jardins de gelo e árvores de tristeza, lugares onde se revelam os espaços vazios de uma morna voz e as cores lineares de um olhar sem juventude, onde nada além do calor de seus corpos importa. Como um diamante que corta a luz, a radiação de suas mentes move-se muito acima de um tedioso desejo, possuídos pelo fantasma de seus corações numa graciosidade à procura de qualquer outro lugar que possa preencher o vácuo de seus interiores vazios, assombrados por uma voz lamuriosa. Suas almas são como ondas violetas caindo aos pedaços, como se estivessem predestinados à fatal sensação que bloqueia a passagem para uma delicada intimidade, pois seus sentimentos são um só. Entre os lençóis ardentes da luxúria, os braços que se esticam e abraçam em silêncio, o sorriso reconfortante, o som dos passos de trás no vermelho do crepúsculo, são como memórias que permanecem no mesmo lugar, como olhos tranquilos amando a excitação dos pulmões cheios do veneno do amor. Esta noite eu a farei conhecer o mundo que não pode ver, invadida pela silhueta do dançarino dos sonhos e levada para o abrigo das fantasias selvagens, onde minha pele ainda queima em todos os lugares que você tocou. Feche seus olhos ao enegrecer dos céus e respire o ar cheio de gelo dos meus pulmões, ouça a canção do meu coração negro e não tema o escuro por ser morno e seguro, aqui uma lágrima é só água e um suspiro é só ar, como um repouso além do sono. Quando nosso coração quente se torna frio com o tempo, a amargura e a solidão nos enlaçam em uma teia pegajosa, esquentando nossas mãos em um fogo gelado para que tudo em que tocarmos vire cinzas de neve, porém essa pílula amarga que tomamos a cada dia só para se sentir a mesma pessoa, é a desordem de nossas expectativas, o sangue que inegavelmente sangra do mundo e nos torna fantoches de um elenco controlado por deuses estranhos. Seja o que for que nos chame pela manhã ou tampe nossa visão à noite, está longe do nosso alcance agora, pois o amor transcende a divindade e a sensualidade afasta nossas mentes do alto, uma sensação muito além dos sentidos ou da vergonha, submergida na naturalidade da carne. Aqui embaixo, você é tudo o que eu vejo, seus olhos encontram os meus e suas músicas de romance tocam em meus ouvidos, sua respiração nervosa enche meu coração com o alívio da amenidade. Como o rosto de um estranho que nunca vi, eu sou atraído pelos doces cheiros que emanam da sua pele e me cercam como nuvens que se transformam em cenas eróticas, enquanto nossos corpos se beijam e ardem esperando o amanhecer. A essência se desdobra e o intimo chama todas as estrelas para caírem na cobertura dos seus seios, ecoando seus gemidos dentro da minha cabeça, enquanto você é ludibriada à medida que eu a puxo para baixo e mudo as posições de suas pernas provocantes para beber o vinho de suas delicias. À deriva, correndo livre dentro da sua mente, as sensações misturadas me fazem perder a noção do tempo, em um mundo onde nada é meu, perdido e me esforçando para desaparecer em seus olhos. Nossos corpos adormecem e apenas o inconsciente permanece, vendo em silêncio o prazer nos matando, em movimentos frenéticos ele nos afoga num eterno orgasmo e enche-nos de um frio êxtase como um hálito gelado, ó amor, você está se movendo muito rápido, eu não consigo acompanhar o seu ritmo, por que sua raiva é viciosa, eu estou enchendo seu ventre com meu sangue branco, mas você continua se mexendo como uma amante insaciável, tão perversa e maravilhosa, seu sorriso se move sem ilusões, seu calor, são como noites de verão, suada, bela e nua, seus olhos parecem ter tantos desejos, a sua presença marca minha pele enquanto sua memória arrasta-se para o esquecimento, o que se passa ao redor, vai e vem, e as coisas boas desvanecem como aqueles que te aguardam... você olha para cima, olhos de vidros fixamente para o desconhecido, enquanto minha alma sussurra seu nome, mas você já não me ouve. Como a sombra de seu segredo, você morre sem nenhum som, os ventos quentes lhe levam através de belos pássaros noturnos enquanto eu danço sobre a sua sepultura até meus pés sangrarem.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

À Beira da Nudez

   Os dias clareiam e as tardes passam em seus próprios ventos de outono, rajadas fora da janela que invadem meu corpo e rasgam minha pele como asas se abrindo debaixo da minha carne. Nessas horas a angústia é um alívio para mim, a droga da tortura que eu preciso, o elixir mais doce que minhas veias possuem ou as pedras infinitas que formam as paredes desse lugar. Eu mesmerizo essa sensação em minha alma, escalando as altas paredes da minha mente, sentindo-me resfriado ao olhar as mesmas manchas frias de cor azul índigo da minha essência, como se minha mente estivesse ampliada e fora dos parâmetros comuns, bebendo o veneno da morte como cicatrizes que permanecem muito depois de o sangramento parar. O sabor amargo desta culpa paralisante me faz sentir que cada passo para frente é uma agonia ou uma espécie de contato comigo mesmo, aos poucos eu percebo que criei o meu próprio inferno de carne e ossos, meu corpo se tornou como um cofre trancado e meus lábios selados como um mudo guardando seus segredos. Carregado de ilusões e mentiras, vivendo da minha maneira e pagando o preço pelos meus erros, os gritos de raiva desaparecem como uma gota de chuva escorregando pelo túnel do esgoto – sujo e cheio de sementes de ódio que nascem a mercê da minha consciência, o sol é apenas uma viagem para o esquecimento do amanhã. Quando as sombras acordam, o silêncio se quebra e abrem-se as portas para criaturas de um domínio negro, pois nos meus sonhos, está sempre lá, a face demoníaca que bagunça minha cabeça e me leva pela neblina de figuras escuras que se movem e rodopiam, audaciosamente, como majestosos olhos brancos me acusando. Envolvido nesse inebriante incenso defumado, as chamas dançantes refletem uma luz púrpura, atordoando prazerosamente o odor penetrante do óleo etéreo que as trevas derramam sobre meu corpo, porém sombrios e esquecidos são os tempos deste escrito: quando as coisas saem erradas, é quase sempre atribuível à minha rebelde e insolente presunção de insistir que os eventos devem se acomodar ao meu egoísmo e vaidade. Meus braços estão cansados e meus pés estão frios, subjugado pela razão de uma dor que não pode sarar, no entanto, em cada grito de um homem encontra-se um abismo de desespero, e neste som silencioso que surge como pegadas na lama é que a verdade está sendo mostrada para você. Veja, contra a sua vontade, o vento frio da noite sopra e atinge seu colar de pérolas resplandecentes, sua casa luxuosa está sendo penetrada pelas sombras do meu quarto, olhando para você, olhos abertos pela metade, incapazes de falar. A água que você bebe flui como pequenas correntezas de vozes silenciosas que conversam atrás das paredes, eles estão indo atrás de você para levá-la às profundezas escuras de um repouso onde a música aviva seu coração, transformando seus medos em esperanças, com ondas espumosas e pancadas de uma chuva gelada sobre seu corpo. Nesta sinfonia da noite você sente a frieza da sua pele como vidro congelado, sentindo as dores de uma sombra vazia sendo compartilhadas nas nuances do seu interior e então, as fagulhas em sua pele como uma ira selvagem, a febre ardente da sua mente ouvindo minha respiração e vendo meus olhos pretos iludidos, sofrendo para te amar no escuro. Ouça os violinos dos salões sem luzes dos meus olhos reveladores, convidando você para suspirar um momento entre o deleite dos espíritos mascarados e nas vagas fantasias da minha cabeça, toda essa beleza de mil-e-uma estrelas luminosas, construindo um alaúde de canções para que somente assim você hei de saber o segredo do talento que se esconde por trás da nossa nudez.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Uma Vinda da Escuridão

   Em uma manhã abrangente uma mente perturbada acorda de seu declínio, os olhos benevolentes se abrem ainda minguados pela noite fúnebre e brilham como serpentes de fogo abraçando seu despertar. Há um lugar perdido debaixo das folhas caídas onde a esperança pousa e enfraquece o dia, levando-me numa ansiedade vil pelo caminho onde a discórdia sacramenta meus anos desperdiçados, incendiando meu coração num transe de uma chuva intemporal. Avante e adiante eu continuo andando por essa nevasca que cai, perambulando perdido e solitário para o mundo traiçoeiro atrás da minha porta: a vida se parece com mil rostos cansados virando as costas para todos os meus sentimentos. As brasas ardentes esmorecem, consumidas pela escuridão como uma estrela irradiante perdendo seu fulgor, morrendo lentamente nos cantos escuros da minha mente dolorida. Eu sempre me senti tão atraído pela melodia do violino que toca os ecos da vida gentilmente passando, dormindo como se estivesse envolvido pelos braços de uma irmã e acordando muito tardio para se deslocar no tempo, em uma viagem só de ida para a estação final. O ruído constante das minhas ambições obsoletas e das minhas palavras infectadas desaparecendo, é o toque do silêncio mostrando como estou me aprofundando cada vez mais nas correntes que minha loucura me aprisionou, onde as trevas crescem sobre as manchas cinzentas que carrego dentro de mim. Posso sentir a presença fria que respira o cansado som do meu coração, mantendo meu sono em velhas épocas ascendentes, onde o desejo de que a vida seria boa algum dia ainda se mantinha permanente, mas quando as imagens estão se movendo entre as memórias, as coisas que parecem resistir se congelam e depois se quebram como uma pedra de vidro lançada ao mar, mergulhando na vacuidade da escuridão. Seja como for que isto acabe, a sensibilidade do que eu sentia foi rompida pela sentença da minha boca, agora túmulos silenciosos me esperam lá fora, a brecha do caixão se abre como uma criança gelidamente me encarando com olhos cheios de tristeza, esperando meu eterno descanso. Em faces quiescentes delineando meu caminho, meu corpo se une com um céu sereno, iluminando o retrato de uma noite solene, quando fui erguido violentamente pelas águas do amor como marcas de unhas por toda minha pele, então encontrei o tranquilo frio da escuridão interior, com os nomes das amadas desenhados acima das árvores... que já não é mais encontrado, pois o forno de seus valores foram queimados e seus rostos desapareceram da minha memória, visitando meus pesadelos adelgaçantes quando minha abstinência regressa como sanguessugas numa doença incurável, amaldiçoando-me com ondas que tampam minha respiração. Enquanto continuo assistindo este teatro negro do amor, eu sussurro, docemente, em seus ouvidos. Eu estou vendo suas muralhas se desintegrando, seus olhos de gelo derretendo em lágrimas e sua mente sendo penetrada pelos sussurros da realidade sombria. O dia está chegando, minha pálida aurora, em que sua frágil imagem deixará de existir junto à minha, a fragrância do orvalho da manhã será sentida no silêncio de um céu de inverno, tão claro e limpo, para que seu nome seja gravado na pedra do meu maçante coração. Nesse oásis de tranquilidade você morará em meus olhos como uma memória preciosa, sentindo de perto minha alma fria e meu coração batendo numa paixão ardente e melancólica por você. O vapor das coisas que perdi em minha mente se tornarão difíceis de encontrar, mas todas as coisas que eu acreditava que fossem verdade mostrarão ser apenas o que jaz na sombra de cada vislumbre de luz que deve desaparecer.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

A Dança dos Sete Véus


Sensual carta anônima

“Amada minha,
Olhando pelas ruas eu achei a sua silhueta e acordei molhado em sua lembrança.
Enquanto invoco estas palavras numa página enegrecida, através de um destino realinhado eu vou encontrar uma maneira de trazer você de volta.
Os sinos soam como milhares de canções badalando o grito de uma morte prematura, mas quando nos encontramos eu soube que elas eram para você.
Eu estou a caminho de lugares que só você tem visto, dentro do baú onde residem suas tentativas para lutar contra este desejo incansável.
Tão puro como um céu boreal e tão macio como o beijo de um fantasma, eu quero sentir pela última vez seus olhos de graça me encarando quando nossas almas se tocarem, assim o primeiro véu será tirado, o véu da ilusão, o segundo, o véu da inocência, o terceiro, o véu do orgulho.
Todos esses anos alcançando o que ampliaria meu horizonte numa busca perpétua pelo seu coração, agora fazem meus ossos tremerem, esclarecendo meu amor absoluto e fazendo com que todas as minhas realizações brilhem neste sonho vitalício.
Eu sinto o aroma do seu cabelo e vejo seus olhos de esmeralda fechados, deitada sobre um epitáfio à deriva no espaço, deixando sua pele numa cor mais brilhante do que o cinza comum.
O quarto véu será o da sua dignidade, o quinto, da sua liberdade, o sexto, de uma prostituta inocente, mas o sétimo véu sou eu... quero protegê-la e feri-la, minha querida, pois conheço a verdade por trás de você – não há nada além de medo.
Risos ecoarão enquanto você saborear os meus gritos, guardando cuidadosamente suas mentiras inquestionáveis, jamais esquecerei a dor e a sujeira que tive de engolir, a alma que você estuprou e as lágrimas do passado que se tornaram o ódio do amanhã.
Você realmente não se preocupa quando a vingança está em você mesma?
O seu âmago será como o vento que sussurra a brisa e ruge a tempestade do mar, até que o solo oceânico se torne a sua sepultura.”

Cronologia