terça-feira, 4 de novembro de 2025

A Última Peça do Poeta

    O sol está dormindo sossegadamente, as florestas calmas e melancólicas, o balanço sob a presença de mil luas. Este é um último verso perfeito, uma poesia sem rima, como as palavras de uma vadia em um mundo frio. Estes prados do céu continuam os mesmos, sem mais sonhos guiadores, apenas duas faces com olhares fixos e pálidos: uma virada para os mistérios do alto, outra para cada rosto sorridente. Venha comigo, estou abrindo uma porta enquanto você lê, beba do meu pensamento, chupe os seios que jamais amamentam, alimente-se de um corpo rendido ao prazer... eu vivi tempo suficiente para ouvir o som da sua ingratidão, para sofrer com os gritos da injustiça, tempo suficiente para ver meus amigos me traírem, enquanto os corvos festejavam sobre um poeta pobre. Mas ele nunca morreu... mesmo quando um excremento escuro e cinzento desceu pelo ralo do banheiro, “salve-me”, dizia em silêncio, mas sua música já não era ouvida – para cada palavra escrita, mil eram apagadas. Agora estou nu, na magia do inverno, de repente casado com um encontro simbólico e desconhecido, mas tão real quanto lobos famintos e doces harpas élficas tocando, pois desde que a conheci algo dentro de mim se transformou: pareciam que todas as estações aconteciam simultaneamente, como se eu molhasse os olhos de uma viúva, quando o único morto era eu. Em menos de uma semana você me levou para dentro da sua casa e a falta de tempo devorou a beleza da nossa paixão, pois três dias se passaram, despidos na sua cama, enquanto seus grandes olhos de opala aceitavam meu pedido de casamento. Restava-me apenas um mês para cumprir meu propósito e você chegou na hora certa, como o eixo de uma isca que me puxava para um riacho de agonia, quero dizer, você me trouxe de volta à normalidade, comendo suas comidas saudáveis, acordando com seu beijo de bom dia e dividindo o mesmo teto, quase como um sonho acordado, como se a voz do espírito santo sussurrasse: “estive preparando algo para você, algo que transcende o ouro e a prata, que abole a feitiçaria, que te salvará da loucura, e a única coisa que você deve fazer é largar mão de tudo”. Ora, como um tapa na minha face, descobri que seu útero era obstruído, em troca disso, você era a mulher que eu sempre desejei ter ao meu lado. Deus me deu tudo, mas tirou a única forma de iluminar as trevas, isto é, de cumprir meu propósito, como um último aviso para que eu jamais me envolvesse com as silhuetas de um anjo caído novamente. Profunda era a ferida entre suas pernas, pois no passado você tirou a única esperança de uma alma vivente, e Deus a puniu severamente, interligando nossos destinos para que no fim tudo fizesse sentido. De que outra maneira eu poderia dizer, que a alma assassina é você? Sua pele é branca como algodão, seus cachos, dourados como a mais reluzente aurora, seu cheiro me invade em cada canto da casa, pois você adora pendurar suas calcinhas... entre murmúrios de desejo, você conversa comigo em silêncio, e é quando eu esqueço das preocupações e aflições do passado, podendo ser a cada dia um pouco mais de mim mesmo. Você faz meus desejos se tornarem realidade como se flutuássemos em um céu enluarado, as pessoas lá embaixo estão dormindo enquanto nós voamos, enquanto o azul da meia-noite é mais profundo, e através do mundo, as vilas passam como se fossem árvores, os rios e as colinas, tudo está ficando para trás. Você é meu presente dos céus, mas o preço que paguei para recebê-la foi abrir mão de tudo que eu tinha, ainda assim, você permaneceu ao meu lado, investindo seu suor para me ver crescer, por que a chuva cai com desejos e o aço corrói a graça, mas é quando suportamos até o fim que demonstramos o amor puro e verdadeiro. Minha alma está queimando, não no inferno, mas de felicidade... sim, Deus me fez enxergar como ser feliz é simples, e todas aquelas coisas que eu acreditava serem importantes ficaram para trás como muitas vidas se passando em um segundo. Agora está ficando cada vez mais fácil de respirar, a alma virgem que vive em mim nunca esteve tão livre, escrevendo palavras feias para você chorar, oh, eu preciso que você cante dentro da minha mente, onde quer que você esteja, na vida ou na morte, pois agora a mágica parece tão distante, eu deixei meu pequeno paraíso e queimei alguma coisa que eu tenho sido por muito tempo, para viver uma vida comum. A noite se abre, guiada por apenas um sentimento, não apenas para sobreviver, mas para morrer vivo.

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