domingo, 12 de abril de 2015

Deite-se com as Trevas

    Entre os lençóis carmesim uma presença se espalha como uma febre escura, enegrecendo as paredes com braços reconfortantes numa radiante escuridão prata repousando inteiramente na calmaria de uma agitação exacerbada. O céu da meia-noite lança seu feitiço e o cheiro de alecrim doce desperta os amantes libidinosos debaixo da neve virgem ofegando entre árvores nuas e levando uma música libertina através da brisa de uma aura atraente. Como membros recém-nascidos de um bebê chiando a cada passo, os gemidos inexprimíveis enchem a terra com um suspiro recheado de vontades luxuriosas, vibrando entre olhos cheios de morte e seduzidos a entregar seus corpos para o apetite selvagem do prazer. Através de uma clareira encantadora em uma noite estranhamente serena com perfume no ar isto está apenas começando, a ficção chega quando os sinais de amor florescem as armas da sensibilidade e nos libertam da vergonha, mas é na realidade que sentimos a envenenada injeção como uma dádiva no céu escuro, escondendo entre arbustos de uma noite chuvosa os olhares das almas em pedaços se deitando na poeira de suas efígies enganadoras. O giro erótico dos súcubos começa quando você não consegue mais dançar, quando sua mente acelera no desejo de ouvir a canção sexual evocada e o incenso da pulsação penetra as silhuetas do seu corpo inabitado. Sob um lugar aonde nada é como pareceu uma vez, eu chamo seu nome e você vem como uma prostituta disposta a meu bel prazer, seu olhar de consolo inflama com a chama da ternura, seus desejos se erguem em pálidos membros frágeis tocando e esmagando com uma dança apressada, trazendo um sorriso cínico na névoa da hora mais escura da noite e inundada antes da primeira respiração do alvorecer. Com passos provocantes eu sinto você se aproximar e seu coração bombeando numa fome crescente por toques gelados, abrindo sua alma para entregar-me por completo e satisfazer seus desejos como um carneiro para o abate, deixando-me deslizar para dentro e rastejar por seu sangue como uma mancha de óleo no mar, emocionando sua carne fresca com beijos ardentes e provando a fruta doce da sua seiva drenada entre lençóis manchados. Debaixo do céu vermelho e da voz descontrolada do vento, eu sou o fogo que queima dentro do seu sangue e a tentação que não se afasta da sua cama, seus lábios frios se corrompem com a rubra mordida lambendo a maré da paixão obscura enquanto envolve a batida rítmica dos espasmos de êxtase... deixando os problemas fugirem e deslizando com facilidade dos meus pés para os joelhos, me possua e me sacie, deite-se comigo e compartilhe o sabor deste gozo queimando, vamos viver rápido e perigosamente com corações cheios e vozes altas, bêbados numa alegria desenvergonhada enquanto desvanecemos no ar com cheiro de almíscar e provocamos a picada envenenada da serpente do diabo.

domingo, 5 de abril de 2015

Sons da Natureza Escura

   Em ébrias sombras vermelhas do ocaso a gananciosa risada dos pecadores me envolve nos fluxos negros da impureza. Eles aparecem à noite, vindo de dentro, evitando a luz, suas vozes sussurram em minha cabeça como um frio hálito insaciável, mas para eles minha aparência é apenas um pedaço de suas imagens vinculadas por algum senso de silenciosas batidas, onde meu coração toca os viciantes acordes de suas almas alojadas no miasma como fúnebres melodias de um piano preenchendo meu corpo com manchas escuras muito surdo para sentir o machucado. A comovente voz da dor me enforca como palavras nunca ditas, nunca ouvidas, mas que num choque de arrepio precisam ser ditas: eles estão voltando no vapor dos meus pensamentos para me rodear como um enxame de sombras furiosas, crocitando como corujas sem olhos em busca de quem realmente eu sou, enquanto o que antecede meu despertar acompanha a boa forma odiosa de tranquilizar o que ficou na incisão do meu corpo pálido. Esta noite o céu está coberto como braços que se abrem espalhando a escuridão, um mundo adormecido no escuro onde poucos conseguem sentir a lenta batida do avanço fúnebre das forças das trevas, lambendo os rios onde o ar frio e arrepiante propaga seu odor lentamente nas planícies desertas e geladas em uma nuvem de poeira, recobrindo a terra com mares de sangue num som abafado de sinos chorando pelas almas escurecidas. Essa lassitude assombra minha mente triste como um gosto amargo de déjà-vu, mergulhando profundamente em agonias insuportáveis, grandes fontes de águas que vazam de olhos pretos fixos em mim – como esculturas idílicas de pedra ou rosas abrangidas do túmulo – eu piso neste anojo melancólico, corroendo minhas mãos coladas de sangue, mas realmente desejo nunca ter existido quando suas presenças congelam as veias do coração, o cheiro que inalam são como corpos inertes brincando de cavar o solo, os lagos dos céus me guardam como um doravante prisioneiro da penumbra em suas garras frias, uma célula aonde a luz não chega, espalhando meus sentidos num langor onde o rosto da morte me acaricia disfarçado de dor e farpas, tão fundo como o fluxo que alimenta os córregos ou a voz do poeta que persiste, este cemitério de olhares infames cumprimentando a meia-noite é onde sou lançado num túnel longo de ansiedades. Os olhos lívidos se apagam lentamente à minha volta, amedrontando o espectro do meu interior como infortúnios de um sofrimento ignorado para deslizar lentamente no clamor do silêncio em meandros de lembranças que já não tenho. Como o prazer elevando-se dentro de mim, meu espírito é levado a vagar pelos vivos, minhas lágrimas são como a chuva caindo ao redor da humanidade e sendo capaz de ler em cada mente a fuga por um sonho infinito, as marcas na minha face são os estigmas de uma confusão profana me consumindo... uma triste corda flutuando acima de uma pira funerária me chamando para abandonar um mundo onde sou mal compreendido, onde homens desejam esguichar sêmen cansados de censuras e mulheres se preocupam com a beleza de um corpo frio, pois ainda que dia após dia essas drogas nos façam sorrir para o espelho, os pecadores continuam a escorregar violentamente na estranha sensação de entrega e engolem o gosto amargo de seus egos insatisfeitos, conduzidos pelo ruído de satanás, aquele que a alça da porta gira e ninguém se cega por tamanha brancura, calmamente tragados por um ligeiro vento nos acariciando como a agonia de uma criança corrompendo sua inocência para se livrar das dores de um momento fúnebre.

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Libélula

   Na faísca de um o sol poente os desertos de uma memória esquecida desaparecem no horizonte como vozes sem fôlego para dar, mas memórias são como palavras que fazem a ilusão, quando suas luzes dissolvem-se para beijar o vento elas repousam na poeira da sombreada lembrança onde os rasgos que pertencem ao frio rancor de uma vida encobrem as escolhas escuras. Como a neve caindo essas memórias ocultam-se em meus olhos vidrados, minhas palavras soam cansadas como uma suave carícia envolvendo o estranho calafrio das agonizantes mentiras desmanchando-se num nevoeiro vermelho-escuro e suspirando minha raiva enquanto vejo o entardecer através do que me assombra os sonhos. Entre os mais afetuosos momentos que consigo ter os ventos falam de lúgubres lares e trazem o choro distante do trovão partindo-se, com sombras flutuantes alcançando meu corpo, cobrindo-o como olhos de um fantasma, num sentimento de quando o tempo não parecia tão cinzento. Eu assisto a minha imagem desaparecer, adormecendo na voz de uma tempestade, enquanto as janelas se fecham e as memórias desvanecem como uma serena canção, mas nada pode me separar dos fragmentos escondidos da minha mente com os segredos que não posso guardar, o gelo percorre minhas entranhas sabendo que meu alter-ego está em você, envolvendo minha dor como fagulhas de uma mágoa, em seus olhos eu vejo a meia-luz de algo se mexendo enquanto a chuva cai e a esperança acorda a calmaria. O medo ecoa fundo e tão claro quanto à verdade debaixo dessa chuva, mas as águas nos despem antes de nos banhar em trevas, descansando suavemente, em sonhos tão azuis quanto o alvorecer da promessa que dorme em seus olhos. Eu sinto nosso fôlego noturno como espíritos dançando no frio, envolvendo a graça de um amor que vive sozinho em nossos corações, pois como olhos que se põem junto ao sol, aqueles sonhos que pareciam tão distantes estão nos cobrindo através de um nevoeiro silencioso e despertando docemente a esperança, uma vez mais sentindo a respiração do suave som onde o vazio repousa. Como macias asas de uma libélula soprando aos confins do céu, eu estou envolvido nesta amnésia, voando ao som de vagas nuvens cinzentas numa geada onde seu reflexo é lançado em meus olhos delineados com o negror da meia-noite, espantando pensamentos cinzas e adentrando diálogos melancólicos, porém a sensação que tenho é a de que uma bomba-relógio está prestes a explodir, tão escura quanto a voz do inverno e tão silenciosa quanto a chuva, sua explosão nos lançará em ventos deslizantes da mais cinzenta paixão, onde mãos pálidas oscilam em ritmo com a escuridão gotejante e sussurros depois da meia-noite ecoam até o azul alvorecer espalhando-se entre as brancas nuvens fragilizadas. Por um tempo desaparecendo rápido de nossas vistas, estamos encarando a mais fria verdade por baixo dos dias onde jaz a indiferença: um retrato de cegos vagando no vazio de espelhos refletindo suas visões como o caixão onde seus sonhos jazem. Os olhos do diabo nos observam, olhos escuros e nebulosos, esperando nossos egos desaparecidos se arraigarem com o tormento, mas sem suspiros nós continuamos correndo na chuva movendo-se entre os gritos do ar gelado enquanto as batidas de nossos corações fraquejam.

segunda-feira, 9 de março de 2015

A Ilusão do Subconsciente

   Em águas imóveis e frescas os olhos de tom avelã observam todo movimento que faço, eles perseguem meu desejo por ventos estranhos como uma mariposa em chamas dentro do pôr-do-sol. Perto da meia-noite todas as regras são esmigalhadas à poeira, uma vontade espalha-se como um flagelo ardente, enchendo meu coração com o ar da doce canção da realidade que não pode ser mobilizada, pois abaixo das nuvens nebulosas tudo se torna uma ilusão, meu corpo é aprisionado em meu próprio subconsciente, mergulhando profundamente em um mar de medo e sofrimento em busca da origem embutida num frasco de julgamento. Eu acordo dentro de um trem dos sonhos, a chuva cai preto e branco borrando tudo o que resta à vista, desmoronando através da minha vergonha intima, onde as sombras são domesticadas no escuro das noites vazias. A cidade me envolve no vento que sopra da tempestade com cores que derretem dentro de amarrações esbeltas, apalpando a névoa bem acima da minha mente, esperando que uma autoconsciência me salve, mas eu percebo que nós vivemos como baratas empilhadas num bueiro sujo e imundo, como pilhas que sobem até o céu em busca de respostas que possam exaltar nossos cadáveres com uma música dançante enquanto a escuridão fúnebre nos rodeia refletindo nossa carne que sangra até que nada reste, os ossos derretendo em um líquido quente e os corações cansados de viver em um mundo de densas trevas.  As pessoas fingem que estão vivendo, mas seus rostos escondem a morte de suas insanas imaginações, vestindo preciosos vestuários para disfarçar o medo de suas almas enterradas na tumba de uma mentira, pois a verdade é feita de loucura: não existe ouro nos céus nem cores cinzentas no inferno. Tudo o que sentem é profundamente em vão a menos que suas ações estejam de acordo com a bússola que aponta para o futuro, pois como esse monstro dentro de nós, todo comportamento já foi previsto e recriado, enquanto somos consumidos pelo encanto de uma miragem entre o crepúsculo e o dia de um universo desconhecido. Cada esquina tem sua estória, janelas como olhos que testemunham sem alma, vendo do que o silêncio é feito, por que não importa o que cultivamos de sabedoria e serenidade nessa vida, nunca seremos mais do quão pequenos somos. Eu sou uma parte disso e sei que o suspiro de minhas lembranças desaparecerá na multidão, sozinho no palco, nunca poderei fazer parte desta realidade ilusória, meus olhos lustrosos encaram profundamente o que o espelho me faz ver, livre para viajar pela existência de uma lâmpada que irradia numa concha opaca transbordando a dor e o vazio, os dias que eu gostaria de trazer de volta ou as flores que desabrocham sufocando o céu de horizontes sem praias, até mesmo quando seu deslumbre é tão fraco... eu posso sentir o calor de seus raios num fluido de estações desaparecendo, todas as coisas unidas como uma luz que beija meu rosto e invade toda a minha alma.

domingo, 1 de março de 2015

No Fim do Silêncio


   O silêncio são como pedras cinzentas que se petrificam no vento deixando o lar e tudo que conhecem para trás. Numa prece silenciosa meu espírito desliza pela manhã num macio cobertor rosa, flutuando pela floresta enquanto desapareço na neblina que toma conta da cidade como o desgosto que preenche meu coração. As ruas carregam o cheiro de sangue e o sabor insuportável de uma doença que vai muito além da nobre linha dos seres humanos, mas é nesse puro êxtase de uma esperança despedaçada que lá eu fico desamparado na esquina, fisgado na loucura de uma obsessão cega pelo cálice de sangue que sacie minha garganta enquanto me desintegro na chuva que se derrama sobre minha alma bêbada e vazia. A solidão continua queimando dentro de mim, esse pesadelo da minha existência – sem amor, calor ou esperança – eu ouço vozes e conversas, mas ninguém fala comigo, a única companhia que tenho é aquela presença invisível que me acompanha como os passos de uma sombra invejosa, pois toda manhã minha alma jaz ausente esperando, um novo dia num mundo distante, com lágrimas tristes correndo sobre meu rosto como calmas águas nebulosas, e se eu pudesse descrever em palavras todo esse sofrimento, então você entenderia que tudo isso que escrevo não são as coisas que gostaria de trazer para o papel. Aí está você a porta, nossos olhos se encontram pela primeira vez, você consegue sentir o inferno da minha realidade como uma parte de si mesma, porém quanto mais percorremos nossos caminhos distantes tanto mais nos aproximamos, pois quando vejo nós dois, eu sei que alguma coisa sobreviveu: as mordidas que nos afastam do que a visão define. No espelho eu mal consigo enxergar quem eu sou, todas as manhãs está faltando uma parte de mim e eu levo apenas o que ainda posso levar adiante, eu me esforço por um pouco da vida que nunca encontrei, mas quanto mais perto chego mais o sumo da minha vida é exprimido, tudo se torna estranho e passageiro como se minha mente fosse preservada na liquidez do tempo. Vagarosamente morrendo, tudo que sinto em meu coração é esta bela nuance de dor como uma promessa nunca cumprida. Antes você me mantinha vivo com suas torturas e suas respostas reconfortantes, mas hoje seu nome soa como um livro vazio, coberta de lama e vergonha. Hoje eu vago por ruínas profundas, perambulando na floresta escura sem objetivo e descanso, mas chegará o dia em que tudo isso se tornará sensível e eu continuarei a desenhar sua figura para assoprar até que se dissolva e nada reste: quase posso sentir o frescor de quando você se tornar apenas uma nostalgia na memória, descansando meus olhos em você numa sensação de paz e sono profundo, impiedosamente esmagando esse sentimento enquanto me balanço na agonia do esquecimento.
   Ainda pendurado suspenso como alguém que puxa a corda, minha voz canta a canção da morte, uma crescente imaginação preparando-me para o que meu coração precisa dizer. Eu não sinto meus sentidos nem consigo alcançar minha voz interior, mas eu pararia de correr se soubesse que ainda há uma chance, por que as minhas escolhas são minhas, eu não estou contra mim mesmo, este é o meu destino e vou enfrentar tudo o que estiver vindo em minha direção, olhando para o fundo do copo esperando que algum dia você faça um sonho durar. A mentira, o diabo, o silêncio, a noite nos céus esta noite, demonstra que estamos correndo através de paredes onde o desconhecido sempre estará esperando e talvez este seja o momento perfeito para contar o que se passa no meu coração. Eu espero encontrar um modo para que você veja o meu sinal, pois quando você acabar de ler estas palavras, verá uma sombra avermelhada à vista, rasgando a costura da sua boca e transformando seu silêncio em cinco palavras, cinco palavras para mudar sua mente e coração: “você vale mais que isso”. Escute, estas são as minhas últimas palavras e este é o meu último adeus, então se você estiver lendo, não desperdice seu tempo em corrigir todos os problemas que você fez em sua própria cabeça. Esta noite você tocará suas mãos em águas purificadoras, segurando a respiração um pouco mais, quando se deparar com a verdade e sua vida ser sugada através do grande buraco negro que se abriu dentro de você. Eu cruzei as fronteiras do tempo, deixando o hoje para trás, apenas para ficar novamente com você – sendo verdadeiro, mas hipócrita com a natureza de deus, pois todas as suas lembranças silenciosas, seus sussurros silenciosos, suas lágrimas silenciosas, eu ainda suportava sentir, e todas elas me faziam prometer que eu tentaria encontrar meu caminho de volta para casa. Quando você tocava piano com suas mãos, os acordes se tornavam vivos, mas a verdade é que a música nunca deixou de ser tocada enquanto eu me iludia achando que você era a portadora da luz. Você me chamou para o seu mundo e permitiu que eu visse através dos seus olhos para alcançar a razão e libertar-me desta falsidade, mas simplesmente eu não podia acreditar que fui deixado sozinho como um criminoso que matou minha própria alma, pois várias vezes eu tentei entender os demônios dentro da sua cabeça, até perceber que você os amava, esperando que a viagem terminasse em morte. Diga meu nome apenas mais uma vez, então eu saberei que você está de volta, ainda tentando salvar este amor enquanto eu o mantenho por perto, por que quando você escapulir das minhas mãos como lama sendo lavada pela chuva, a escuridão engolirá sua alma mortal e o véu dos seus erros iludirá o que você tanto procura. Este será o seu ápice mais sombrio, pois é no inferno que obtemos o que queremos obter. A nossa beleza vai morrer quando deixarmos nossas palavras não ditas, mas agora minha pele está gelada e fúnebre, com um sorriso eu assisto você ficando para trás, o silêncio chega e estou tão calmo e em paz como algo se partindo por dentro, escondendo os segredos da minha existência em uma vida arruinada.

Cronologia