domingo, 5 de abril de 2015

Sons da Natureza Escura

   Em ébrias sombras vermelhas do ocaso a gananciosa risada dos pecadores me envolve nos fluxos negros da impureza. Eles aparecem à noite, vindo de dentro, evitando a luz, suas vozes sussurram em minha cabeça como um frio hálito insaciável, mas para eles minha aparência é apenas um pedaço de suas imagens vinculadas por algum senso de silenciosas batidas, onde meu coração toca os viciantes acordes de suas almas alojadas no miasma como fúnebres melodias de um piano preenchendo meu corpo com manchas escuras muito surdo para sentir o machucado. A comovente voz da dor me enforca como palavras nunca ditas, nunca ouvidas, mas que num choque de arrepio precisam ser ditas: eles estão voltando no vapor dos meus pensamentos para me rodear como um enxame de sombras furiosas, crocitando como corujas sem olhos em busca de quem realmente eu sou, enquanto o que antecede meu despertar acompanha a boa forma odiosa de tranquilizar o que ficou na incisão do meu corpo pálido. Esta noite o céu está coberto como braços que se abrem espalhando a escuridão, um mundo adormecido no escuro onde poucos conseguem sentir a lenta batida do avanço fúnebre das forças das trevas, lambendo os rios onde o ar frio e arrepiante propaga seu odor lentamente nas planícies desertas e geladas em uma nuvem de poeira, recobrindo a terra com mares de sangue num som abafado de sinos chorando pelas almas escurecidas. Essa lassitude assombra minha mente triste como um gosto amargo de déjà-vu, mergulhando profundamente em agonias insuportáveis, grandes fontes de águas que vazam de olhos pretos fixos em mim – como esculturas idílicas de pedra ou rosas abrangidas do túmulo – eu piso neste anojo melancólico, corroendo minhas mãos coladas de sangue, mas realmente desejo nunca ter existido quando suas presenças congelam as veias do coração, o cheiro que inalam são como corpos inertes brincando de cavar o solo, os lagos dos céus me guardam como um doravante prisioneiro da penumbra em suas garras frias, uma célula aonde a luz não chega, espalhando meus sentidos num langor onde o rosto da morte me acaricia disfarçado de dor e farpas, tão fundo como o fluxo que alimenta os córregos ou a voz do poeta que persiste, este cemitério de olhares infames cumprimentando a meia-noite é onde sou lançado num túnel longo de ansiedades. Os olhos lívidos se apagam lentamente à minha volta, amedrontando o espectro do meu interior como infortúnios de um sofrimento ignorado para deslizar lentamente no clamor do silêncio em meandros de lembranças que já não tenho. Como o prazer elevando-se dentro de mim, meu espírito é levado a vagar pelos vivos, minhas lágrimas são como a chuva caindo ao redor da humanidade e sendo capaz de ler em cada mente a fuga por um sonho infinito, as marcas na minha face são os estigmas de uma confusão profana me consumindo... uma triste corda flutuando acima de uma pira funerária me chamando para abandonar um mundo onde sou mal compreendido, onde homens desejam esguichar sêmen cansados de censuras e mulheres se preocupam com a beleza de um corpo frio, pois ainda que dia após dia essas drogas nos façam sorrir para o espelho, os pecadores continuam a escorregar violentamente na estranha sensação de entrega e engolem o gosto amargo de seus egos insatisfeitos, conduzidos pelo ruído de satanás, aquele que a alça da porta gira e ninguém se cega por tamanha brancura, calmamente tragados por um ligeiro vento nos acariciando como a agonia de uma criança corrompendo sua inocência para se livrar das dores de um momento fúnebre.

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