segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

A Dança dos Sete Véus


Sensual carta anônima

“Amada minha,
Olhando pelas ruas eu achei a sua silhueta e acordei molhado em sua lembrança.
Enquanto invoco estas palavras numa página enegrecida, através de um destino realinhado eu vou encontrar uma maneira de trazer você de volta.
Os sinos soam como milhares de canções badalando o grito de uma morte prematura, mas quando nos encontramos eu soube que elas eram para você.
Eu estou a caminho de lugares que só você tem visto, dentro do baú onde residem suas tentativas para lutar contra este desejo incansável.
Tão puro como um céu boreal e tão macio como o beijo de um fantasma, eu quero sentir pela última vez seus olhos de graça me encarando quando nossas almas se tocarem, assim o primeiro véu será tirado, o véu da ilusão, o segundo, o véu da inocência, o terceiro, o véu do orgulho.
Todos esses anos alcançando o que ampliaria meu horizonte numa busca perpétua pelo seu coração, agora fazem meus ossos tremerem, esclarecendo meu amor absoluto e fazendo com que todas as minhas realizações brilhem neste sonho vitalício.
Eu sinto o aroma do seu cabelo e vejo seus olhos de esmeralda fechados, deitada sobre um epitáfio à deriva no espaço, deixando sua pele numa cor mais brilhante do que o cinza comum.
O quarto véu será o da sua dignidade, o quinto, da sua liberdade, o sexto, de uma prostituta inocente, mas o sétimo véu sou eu... quero protegê-la e feri-la, minha querida, pois conheço a verdade por trás de você – não há nada além de medo.
Risos ecoarão enquanto você saborear os meus gritos, guardando cuidadosamente suas mentiras inquestionáveis, jamais esquecerei a dor e a sujeira que tive de engolir, a alma que você estuprou e as lágrimas do passado que se tornaram o ódio do amanhã.
Você realmente não se preocupa quando a vingança está em você mesma?
O seu âmago será como o vento que sussurra a brisa e ruge a tempestade do mar, até que o solo oceânico se torne a sua sepultura.”

sábado, 31 de janeiro de 2015

Rosas Pretas


Sensual carta anônima

“Amada minha,
Atrás da sua máscara eu vejo medo em seus olhos, um frágil coração de vidro.
Lágrimas negras estão escorrendo pela sua face, afugentando seus pesadelos em noites inquietas.
Olhe para o seu amado morto, todas as doces promessas que ele fez se desintegram na poeira, ele beijou seu corpo de prata e cheirou seu sangue morno, mas não pode escuta-la agora.
As coisas que você tem se tornaram como a cor da noite, como uma canção feita por você, uma alma envenenada pelas lâminas da desilusão.
Seu olhar vazio congelou suas esperanças, mas uma parte de mim ainda vagueia sem rumo em seus pensamentos, sugando o sangue de seus lábios ferventes e lambendo as feridas da sua pele trêmula.
Não tenha medo, este é o nosso futuro, ouça esse som das águas refletindo o sorriso do destino, limpando as manchas de nossos corações como olhos que se movem pelas paredes.
Este é o dia em que todos os seus sonhos se tornam realidade, as lágrimas que tem chorado não são nada comparado ao que tenho reservado para você.
Você dançará como jamais dançou antes, sentirá como a fragilidade de uma flor ao vento, sorrirá como um veludo de estrelas desafiando a escuridão...
No fundo da sua alma arderá o fogo da paixão, despertando todas as faculdades mentais e enchendo seu corpo de luxúria, seus lábios quentes tentados pelo jogo dos prazeres proibidos.
Eu tenho te visto no fim desta noite brilhando como paredes pintadas de branco, suas pegadas são como nuvens de neve silenciosas, correndo por lugares secretos com cheiros adocicados.
Descendo em eterna profundidade, todas as coisas amáveis que você sempre sonhou irão envolvê-la como você nunca imaginou antes, e assim seu interior será entregue à resignação silenciosa.
Feche seus olhos uma última vez e sinta a vida transbordando uma nova esperança que renasce, desvanecendo seu passado como um corpo de rosas perdido na memória.”

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

O Lamento do Amante

    Uma fraca luz se movia suavemente por um campo coberto pela grama recém-nascida e ecoava seus gemidos de consolação, enchendo de tristeza os pássaros que lá sobrevoavam. Nos céus negros as nuvens abraçavam o silêncio vagando por cenários desolados, reunindo os poderes da lua gótica como estrelas que brilham num vale de relâmpagos, mas perdida era aquela que lamentava sob a árvore solitária por seu amado. Lá no fundo de mim, eu sabia que a encontraria ali, vendo o tempo chorar lento como uma lamentação, queimando meu coração preto com uma chama inspiradora que aliviava meu desejo por uma dolorosa aflição que crescia como um lânguido brilho lunar banhando minha pele com silenciosos ventos e canções suspirantes, ventos que estabelecem a sinistra doçura dos tempos cheios de magia, semeados com canções desconhecidas e arranjos melancólicos, em uma música hipnotizante e prefixa, isto é, a poesia do amante embriagado pelo triste som da sua perda. No ébrio da solidão eu já não temo os majestosos reinos da morte, pois penosamente na brisa da manhã a tranquilidade acaricia meu rosto como um manto de veludo, um sol ainda quente colorindo o céu, com prados brilhando numa luz dourada na véspera da morna voz do verão, em esmeraldas enfeitiçadas pela mordida da penumbra do anoitecer. É através desse lugar obscuro, o qual chamo de solidão, que as folhas vermelhas cobrem meu corpo e pintam com o gelo os tons decorativos da minha angústia, viajando pelos sonhos infindáveis onde um pássaro noturno canta seu lamento, voando numa chuva gentil de lágrimas que continuam a cair quando a noite chama pelo seu nome. É como uma má conexão entre os opostos, como a vida inteira sem você sob um canteiro de flores tentando alcançá-la com um sentimento sem limites nem regras, aliviado por que a inocência ainda está lá. Com amor ardente você iluminava meu céu como as chamas que lambem meu corpo, você se apaixonava sem se preocupar com o amanhã e atravessava anéis de diamantes com aparências ousadas, cantando nos festivais da noite e desfilando em seus lindos trajes reluzentes... até o momento em que o mundo virou as costas para você e deixou-me aproximar-se, acendendo este escuro amor secreto como um selo sobre o seu coração. Mas um coração vazio é sempre frio como pedra, como luzes de neon vagarosamente sombrias arrastando a aurora, você carregou toda minha alegria, apenas para ter em seus braços uma corrente de flores murchas, amores que nunca encontrarão a verdade sobre você ou conhecerão aquela que se esconde atrás de um sorriso tímido, não verão a luz que queima no seu olhar nem sentirão seu cheiro que abastece a noite. Do jeito que meu corpo vibra quando estou com você, diria que meu coração é errante, pois você é a coisa mais magnificamente linda que eu já amei neste mundo, o jeito como você me olha, me faz desejar você mais perto, quando você balança a cabeça para sorrir, eu desejo que a noite se torne manhã e brilhe como num sonho rosa, com cheiro de chuva distante e gosto de água térmica, movendo devagar pelas ondas e gargalhadas do vento, como o beijo de um homem cego, um silêncio repentino com seu rosto girando na poeira, esperando que o dia se vá. “Eu te amo”, diz os meus olhos negros perolados, “perdão”, diz a minha sombra num sussurro suave, permanecendo imóvel embaixo da profunda saudade enquanto as luzes se apagam e ouço a escuridão respirar.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Descanso no Suicídio


Sensual carta anônima

“Amada minha,
Por um longo tempo eu tive o sentimento de que você estava despertando meus sentidos, mas agora quando estou muito longe para conseguir pensar, eu continuo encontrando apenas a outra parte de mim.
Debilmente como alguém que assume o controle, a alma mestre está assinando com a mão egoísta o contrato para possuir minha mente, inteira.
Olhe para as sombras nas paredes, o sopro que foge para fora do candelabro queimando até as cinzas, assim como essa vela eu estou perdendo minha vida.
Nos dias claros observei o nascer do sol e as cores que ele trazia, esperando pelo pássaro negro que era meu anjo por dentro, mas ele nunca retornou.
Assim, aqui estou, mas não posso explicar-me, pois penso que escrevi mil palavras e nenhuma delas poderia dizer o que eu sinto.
Durante a madrugada eu enxergo rosas pretas e folhas brancas, tão pálidas quanto seu rosto, e suas pétalas sobem à luz, desvanecendo profundamente em meus sonhos, balançando minhas memórias como a água gelada que corre em seus olhos.
Neste naufrágio, com minha alma tempestuosa possuída pela vontade de lhe encontrar, eu espalho sementes para desenrolar meu próprio desfecho.
Mas embora eu saiba que tudo isto seja em vão, o tempo passa e ainda estou respirando através dessa caverna sem a intervenção da luz.
Todos parecem tão distantes de mim agora, todo esse tempo eu estive me escondendo no escuro?
Minha alma se transformou em cinzas e o meu otimismo, em dor, desenhando a cortina com a lâmina nascente.
Quando a noite abraça a orla com suas mãos frias e escuras, ó, não se desespere, eu sou a tua luz na alegria e na tristeza, eu sou a tua fantasia, diz a alma mestre, cante por todos os amores que você perdeu, por todos os amigos em que você costumava confiar!
Na beleza de uma realidade distorcida, eu continuo dançando com as sombras em um caos tranquilo, vendo em meus olhos apenas o rígido pesar da obscuridade.”

domingo, 18 de janeiro de 2015

A Maldição do Paraíso


    Num retrato manchado uma chance de observar quem eu era pareceu ser a única paisagem à vista. O fundo da memória borrou todas aquelas luzes em excesso, uma coleção sem valor de esperanças e antigos anseios desaparecendo pelos cantos de um destino desvendado: um futuro onde não havia absolutamente nada. Por um instante pareceu que uma nuvem de amargura simpatizaria comigo, mas meus olhos não desgrudavam daquela imagem com a minha verdade pintada, conduzindo-me para desconhecidos sentimentos e sons, onde meu reflexo como pessoa já não era o que eu estava acostumado a ver. O retrato revelou os segredos do meu passado, mas eu não podia banir aquele fantasma estranho, vendo-me cair num abismo enquanto rostos felizes desapareciam e vozes silenciavam num lugar escuro onde eu não conhecia. Quando enxerguei-me desalmado e inclinado à destruição, também vi as boas razões da minha vida sendo arrancadas pelas raízes – um olhar lamentável além do medo e do terror, preso numa jaula e rendido no mais violento desequilíbrio, movendo-se sob a reação do meu próprio carretel a medita que me aproximava da borda inescapável. O amanhecer era como um véu que trazia consigo uma angústia queimando, derramando do céu a essência do remorso, lágrimas e tormentos, sem cicatrizar as feridas. Talvez eu sonhasse apenas com uma vida ao invés de uma simples sobrevivência, com o reconhecimento do meu trabalho, sem enxergar a luz do mundo que chega para as marionetes, pois qual a diferença quando mudamos o caminho que sustenta o começo? Eu sinto como se estivesse escorregando na confusão do esclarecimento interno do animal, imóvel, dentro da minha mente, enquanto fecho os meus olhos e o mundo da fantasia se despedaça, rasgando as costuras das escolhas que me levaram a este epílogo.
    Esta noite eu recebo o guardião da marca da besta com um “bem-vindo” caloroso, embrulhado em frieza, com o toque dos ventos refrescantes, vagando por lugares bonitos do meu passado. Nos bosques as mais antigas histórias voam entre os ecos da ventania, levando um pouco do cheiro e das vozes para cada árvore que carrega as memórias dos que passaram por ali, como as estrelas se escondendo do amanhecer, assim os ancestrais desaparecem deixando suas heranças. Assim como há muito tempo um deus foi sacrificado. Venham, corram amadas, a celebração já começou, tomem seus assentos nos melhores lugares e vejam como o herege queima, eu digo, ele sentirá a morte, chegando devagar e aos risos, quando as filhas do demônio cortarem o fio da sua vida com a foice severa. Olhem para as cinzas do que ele foi quando contou aquelas mentiras e quando seu último grito morreu, as chamas o consumiram. Enquanto falo, eu tremo por causa da ira de deus, para o meu deus – um sacrifício – sangue foi derramado, aprendendo a sabedoria proibida, onde mentes e estrelas se unem nos segredos da astronomia. A fúria em seus olhos são como tochas em minhas mãos, deixando o medo sobre a procissão sombria de cada ato cometido, e profundo é a tristeza dos seus gritos quando ecoam na brisa noturna. A verdade dói, mas o olho de deus brilha como um sinal escuro que enobrece a mente, sua respiração aquece o ar de inverno e sua ira cintila como uma punição para os pecadores. A luz da vela brilha palidamente quando as trevas acordam a besta, pois a demência sofrível está crescendo com um sabor amargo, eles estão chegando mais perto... você consegue sentir? Consegue ouvir os ecos dos que estão morrendo lentamente? Em sonhos eu vi coisas que acontecerão: cadáveres no chão, crianças chocando em explosões de sangue, a besta feroz nadando através dos rios e arrastando a humanidade, mas tudo isso já não foi escrito no livro do senhor demônio? O que estou tentando dizer é que um dos capítulos mais escuros do homem está apenas começando, uma época onde a paisagem mostrará cinzas como o retrato da minha alma, nuvens escuras que escondem os ocultos olhos do poderoso deus. Coisas, ainda não vistas pelos olhos humanos, oh, minha vida, meu sangue, minhas lágrimas, minha dor, de que servirão todas essas coisas quando o fogo divino julgar o mundo? A trombeta soará e a tempestade descerá dos céus como os sinos que tocam os gritos da geada, o solo, vermelho como folhas de outono, se tornará em carne e ferro... a vibração das aves se tornará um com os sussurros dos moribundos, e dos milhares de nós que haviam, restará apenas os que tomaram a mãe morte como noiva, os risos ecoarão de jubilo na escuridão! Quieto, quieto, alma assassina, o que você está dizendo? Essas mensagens de morte e ressurreição já não nos aterrorizam. Ao soar da meia-noite tudo isso passará e um brilho dourado onde estrelas cintilam vigorosamente a celebração da nova era, será aceso para todos verem e ouvirem a doce melodia da morte de deus! O murmúrio crescerá até que a raiva se torne um cenário, centenas de tochas acenderão junto à sua luz silhueta e todas as pessoas da terra farão um funeral nesta praça da meia-noite. Quando as duas luas se unirem, lágrimas silenciosas cairão e a chuva vermelha despertará a criança da besta, dormindo. Não haverá punição, nem fogo, nem peste, nem dor, apenas uma oração... o choro das crianças perdendo o próprio pai, tornando o mundo liberto por suas frias emoções, em uma ilusão que vivíamos para livrar a mente das trevas, nosso sangue e lágrima fluindo através do filho de deus. Enquanto entardece, a noite acorda e a terra é pesarosamente envolvida em silêncio, vendo a beleza de um novo século. Com o tempo a duvida desaparecerá e teremos uma fraca reflexão do universo que nos rodeia.

Cronologia