sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Fração Absoluta

   Nascido para o vislumbre dos sentidos, as possibilidades estão se desvanecendo sem deixar vestígios. A passagem do tempo é como batidas do coração, questões que se deitam na superfície de uma consciência alimentada cuidadosamente pela realidade. O momento está passando por mim, lentamente girando em um contento passivo, cegando-me por um maravilhoso mundo onde a beleza vale menos do que a canção de um raio. Eu aceito que algumas coisas nunca mudarão, mas isto deixou-me com uma dependência química pela insanidade, uma mente que magnifica minha agonia ou a harmonia do que é respirar para sempre em campos onde a grama cresce alta como tapetes de ouro que incham e sussurram as eternas lágrimas que caem da chuva, um amanhecer aberto como uma ferida que sangra novamente ou como flores que murcham no sol do meio-dia, decorando a paisagem. O céu é lilás e os meus olhos vermelhos aqui dentro. Eu posso sentir eles se aproximando dos meus frágeis sonhos, através da minha resistência em mantê-los como cicatrizes abertas no meu coração, entregando minha alma ao que verdadeiramente parece real ao meu corpo mortal e inútil. Procurei a noite inteira para descobrir o que estava acontecendo, então de alguma forma eu sabia que havia algo de errado naquela luz paradisíaca que me cobria por dentro... a escuridão escapava sem nenhuma palavra saindo dos meus lábios, apenas um beijo dourado, silenciado por aquele olhar cinza-esverdeado e a pele madrepérola como um deserto jardim branco incessantemente esquecido. Na borda do universo, ela era como uma distração de verdades que eu não ousava encarar, a alma assassina viu, através dos olhos do céu, em uma ilusão sonolenta... e transfixa, como se ao menos por pensar nela as trevas me cobrissem. No vazio contemplava o destino de uma luz morta em presunções espirituais de campos elísios como sendo o caminho que eu percorria, em outras palavras, a minha escuridão era você. Esta é a beleza de uma realidade distorcida: outra revelação gloriosa intensamente como a morte do sol, dançando com as sombras, em uma memória perturbante da intervenção da luz verdadeira, este véu de suicídio... pobre intensa aurora, em seu enigma à luz do luar de um abraço pálido, bem no interior do silêncio somando os seus segredos, a fração que te domina como a risada que flutua na brisa do mar, subindo e caindo e morrendo dentro de mim, a luz que vem das ondas para conhecer o espaço da mente... porém há uma tempestade se aproximando entre memórias meio esquecidas, deixando-me à deriva por sentimentos que me chamam vindos de você. O verão amanhece escuro em minha memória e perdido no fundo da minha alma em um lugar cercado por eras de esquecimento, tudo o que eu sentia se foi, mas o meu espírito ainda respira, eu não vejo sentido em continuar, um estrangulamento da realidade gritando dentro de mim, então... aguentando apesar das dúvidas, eu sempre recordo que ninguém pode me encontrar aqui, escapando das leis das dores inexplicáveis como ecos atormentados de um éden sucumbido. Eu desejei intensamente a sua beleza e o seu amor, mas tudo que consegui foi sucumbir na escuridão em busca de esperança. A solidão me deixou cego pela ausência da minha alma-gêmea, esse é o meu final? Está ficando tão frio... as sombras diminuem e aumentam, o meu sangue escurece como o interior de um drácula... você ainda está petrificada nessa eterna fração de segundo?

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Atração Perigosa


   Um dia a luz me trouxe você. Não foram minhas roupas enegrecidas ou meus olhos polidos de sílex, eu recordo-me bem daquela noite, a luz divina que acendeu no meu peito e a fez aparecer, brilhando como uma lua de outono, a água em seus olhos dizia que estávamos ligados. Naquele dia, o poder divino trouxe-me você por algum motivo, abriu meu coração para lindas palavras surgirem em antigos escritos de sangue, palavras leves como uma névoa ancestral destinadas à você. Aurora, a sua doçura era como um câncer, mas sendo eu libra, via o modo como a obscuridade desapareceu com a sua chegada, como nosso laço era fiel comparado ao arco-íris que retorna para manter sua promessa. Esta noite a razão da luz é novamente recuperada, um despertar onde o gelo brilhará numa grande explosão de sentimentos despedaçados em nuvens de chuva. Nesta tão sonhada noite nossas correntes se partirão e livremente voaremos como pássaros felizes, resgatando os nossos dias escuros e frios, os dias em que a nossa essência era manifestada com um único sorriso inalcançável, tão verdadeiro, assim por muito tempo esperando através da possessão. Este é o dia escolhido, o último passo para minha iluminação, o estado de expectativa que atravessará todos os seus círculos espirituais, mas não seja eu um lugar aonde a luz nunca chegou, agora eu entendo de quem é essa luz, em profundidades além dos meus gritos e pensamentos encobertos, gritos que caem caladamente e pensamentos como pressões em veias sufocantes... a luz divina que nunca se apagou em meus olhos, milhares de cores pintando a sua paisagem, libertando-me do espaço que borrava meu rosto pálido como uma água fria que me cobre. Ó, amada minha, este é o meu poema de lamento... eu confiarei nessa luz e saberei que em poucos dias ele não estará mais entre nós. Sete luas, lembra? Em sete dias você retornará e dará um sinal de amor verdadeiro. Sete dias para que eu possa me enforcar em minha própria loucura.

sábado, 4 de outubro de 2014

Fria Primavera

   Em meus templos pingam orvalho negro, lentamente, os meus lábios bebem o frescor da pedra azul em obscuras interpretações. À noite, quando ando nos caminhos escuros, minha figura parece pálida, quando tenho sede, bebo a água branca da lagoa, o gosto da minha triste infância. As nuvens escuras formam um céu perfeito, a chuva começa a cair e sinto o vento tempestuoso em meu rosto, correndo num relâmpago brilhante em sua direção. Amada minha, veja, eu estou chegando, e espero que você esteja sabendo. Esse é apenas o começo de uma nova promessa que nos unirá para sempre, mas por mais que eu escreva mentiras obscuras como o mar da meia-noite, você não conseguirá enxergar a verdade. O meu poder está voltando e as aureolas das minhas mãos congelam em um profundo azul... sinto tão claramente a sua pele branca e os seus lábios vermelhos cantando como uma sereia do anoitecer, nadando em escuridão. Na noite profunda, eu a roubarei e sumirei da sua consciência como poeira, falando suavemente na sua mente, minhas suaves e escuras asas flutuarão cobrindo-a com a minha sombra, então você olhará para cima, dizendo: “ó, belas trevas, o meu amante me espera”, mas aqueles que estão à sua volta não te ouvirão, eu serei os teus ouvidos, os teus olhos e o teu deleite, sentindo o ar quente da luxúria preenchendo o seu ser, chamando tão amavelmente os débeis sonhos que tecem a noite em um mundo onde a alma se movimenta livremente... esta é a escuridão de que tanto falo, não são os demônios que você acha que me perseguem, garota tola, o que sabes tu dos que cobrem a praça às três horas da madrugada? Ou dos que selam o coração em uma sintonia com o ódio? Pergunto, por que não vê o humano que há em mim ao invés do diabo? Agonizado, não há ninguém ao meu lado na hora da minha queda, pois eu não sou o que você procura, antes, você dizia: “sou apaixonada pelas trevas que há em você”, mas não há trevas em mim, as trevas estão ao nosso redor esperando escurecer seus olhos, esperando que as esperanças se percam e abandonem o seu destino como um vento sonoro em becos escuros, por favor, você consegue entender minha profunda dor? Consegue ver o quão real é a luz fraca que queima em meus olhos? Você fugiu da minha vida como cartas escritas na areia, mas sequer me conhecia, sequer se importou com o que carrego em meu coração, com um sorriso falso dizia que tínhamos um laço, com um sentimento vazio clamava pelas minhas palavras, mas tão instável quanto o céu que se torna claro e negro, os seus desejos desapareceram, o seu amor murchou-se e você tornou-se leviana, dançando com sua alma em um enxame de vaga-lumes. O que posso fazer? Eu fecho meus olhos, abrangendo o poder da vida, sempre acreditando que somos mais do que podemos ver, que os limites invisíveis jazem dentro de nossas mentes... o passado me assombra, fragmentos de memórias que perturbam o meu espírito, tristezas tão profundas como os oceanos cinzentos dos meus olhos, ainda assim, um raio de luz queima através da minha insanidade como uma esperança ardente, esperando que o seu retorno transcenda a lúgubre aurora.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Esperanças Esquecidas

   Na beleza dourada do amanhecer ou nas sombras que atravessam as árvores, eu vejo um rosto sereno com tons sussurrantes de clareiras como a visão de um abraço agonizante. As luzes veladas como diamantes me fazem flutuar através do céu, vendo a vida muito abaixo da minha mente, respirando a serenidade e a verdade, encontrando meu caminho para voar livre dos confinamentos do tempo. Como a alvorada que emerge eu ouço ecos e vozes me chamando, mas não permito que a obscuridade me engula: eu levito, fitando meu cadáver inanimado à deriva em direção ao que agarra minha sanidade, escondendo-me desta terrível realidade... receios de memórias que voltam a me inundar, embora haja uma teimosa mente atrás destes olhos frios buscando o sentido da canção da vida lentamente enquanto tropeça no tempo estendido. Olhando para este mundo através dos meus olhos, eu procuro sentir algum fervor que me leve para longe do que estou acostumado a ver, mas as rodas da vida giram sem mim, o sonho continua me carregando em momentos perdidos que se foram. Entre fantasmas, alucinado em minha consciência, o intenso pulso estrangulador da morte aperta-se sobre mim, em meus ossos eu já não sinto frio, meu sofrimento cresce com o aumento da culpa afundando-me no solo úmido em sintonia com a terra. Desaparecendo até que o espelho da morte reflita o significado da minha vida, caminho sem destino e hipnotizado, essas mensagens masoquistas que vão para dentro da minha alma, chorando através de anos sem defesas subconscientes, em frações de segundos me fazendo acreditar numa pacifista e satisfatória realidade, quando a verdade pode ser tão cruel quanto à natureza corrompida da minha liberdade. Assim, como cheguei até aqui? Flutuando em lugar nenhum para se esconder, sinto como se a vida nunca tivesse sido o que realmente é. Minha tristeza é fria, mas isso não me impede de respirar, tentando encontrar um caminho para o exterior conversando com uma parede da minha mente, uma viagem no interior onde os elos se rompem e me levam à outra realidade astral, numa harmonia serena, sonhando e acordado, os ventos ficam silenciosos, a respiração mais lenta, os lábios se movem, mas não consigo ouvir o que estão dizendo – a escuridão arranca as cinzas da minha alma pelo mais profundo amor dissolvido em emoções construídas por um silêncio eterno... aquele rosto de verão, confortavelmente entorpecido, da aurora em chamas ardentes. Bem fundo ansiando, eu sinto meu coração queimando por ela, esse belo sentimento que navega pelas nuvens do meu corpo como uma sombra. Lá, olhe, o carvalho se inclina sobre o rio como uma pessoa que se curva, chorando pelo amado... você pode polir sua alma mas não pode ver como nós sempre passamos dentro e fora para um pouco de infinidade do espaço em branco. Enxugue as lágrimas de ontem, suas lembranças congeladas, deixe a criança autônoma dentro de você retomar, uma fria brisa abaixo dos seus pés lhe levando ao entusiasmo das cicatrizes secretas, sonhando com a luz do nascer do sol, e de repente... tudo se encaixa, o céu... o mar... as folhas que desprendem das árvores e o vento espalha, então você percebe que a luz nunca esteve tão distante. Aqueles momentos desperdiçados não voltarão e nós nunca os sentiremos novamente, mas sempre comigo, você aparece diante dos meus olhos, um suspiro enfraquecido do que algum dia o pôr-do-sol deixou em nossos corações.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Coração Manchado


   Esta noite encontro-me sonolento e frio. Abaixo das nuvens nebulosas meu coração é tocado por uma estranha melodia. Em aflitos tons de cinza alguém desaparece nos nevoeiros e apenas flashes da sua aparência permanecem, congelado na frieza da minha alma, como se me levasse ao mesmo destino. A estrada parece estar se encerrando por trás e os sinais me levam a um caminho que não posso ver, imagens distorcidas da minha vida e pensamentos obsessivos que me chamam aos corredores sufocantes, ventos estranhos soprando meu castigo iminente, um vínculo imortal, vazio na extremidade do que permanece como o cadáver de um demônio. Essa agonia dissolve-se em um brilho no vácuo da sombra de um segundo, um indesejado estado de espírito, que me faz ver como no interior da minha mente o destino é somente uma forte expectativa. Onde está a luz? Apagou-se e minha mente tornou-se vazia como uma caverna, escura como um túmulo nefasto, queimando, tornou-se cinzas, e as cinzas voam com o vento para arrancar o meu fôlego, sufocado, estou perdendo a vida, perdendo meu lindo vermelho, meu escuro sangue deixando minhas veias... sem ameaças, sem medos, esse lindo vermelho é tudo o que vejo, pingando... estou sangrando e me sinto bem, só um corpo pingando até a morte, só uma alma achando seu caminho. Olhando para o céu e a lua cheia, do jeito que sussurro minhas últimas palavras, elas parecem desaparecer, uma vez que tomei minha decisão há muito tempo atrás. Ninguém sabe quem eu sou, ninguém me perderá. Tão esquecido como águas geladas de um córrego, sou apenas metade em meu corpo e posso sentir, a alma assassina morrendo... eu suponho que não há ninguém igual a ela, mas não posso deixar que controle o meu corpo, nem a minha mente, nem a minha língua, como você esteve perto de mim a vida inteira. Deu-me sentimentos profundamente fortes, mas o que esperava ganhar? Eu suponho que você esteja muito bonito adormecendo e deixando de viver, alma assassina, agora eu posso viver como realmente devo, matando a mim mesmo para voltar à vida. Mestiço da luz e escuridão, ela respondeu, você não pode ser o que não é. Então, dentro de mim, minha alma adormeceu e por um instante pude sentir-me tão morto quanto uma rocha sólida, antes que ela tomasse sua parte e desfizesse o nosso contrato. Assim disse a alma assassina: corre pássaro, sem as tuas asas. Corre, corre, um pouco mais. Haverão céus para te consolar ou asas para que possa voar? Os meus olhos ardiam, desafiando-a, sem olhar para trás, eu corri o máximo que meus pés aguentavam, mas de alguma maneira ela parecia ainda mais próxima. Sua voz soava caótica como sua cor: corre, mensageiro do medo avistado! Reza ao pai, vagando na loucura que reside. Corre, perdido, perdido! A verdade doía tanto, agora, os anos perdidos eram como ruínas possuídas, rastejando em uma assombrosa mentira. No fim, ela voltou para dentro de mim. Morto, conseguia sentir. Somos um, a voz demoníaca cantava, somos um, somos um, a dor silenciosa sem luz, somos um, somos um, somos um. Foi assim que a alma assassina calou-se, mas eu não saberia dizer quem estava morto. Eu ou ela?

Cronologia