sexta-feira, 25 de março de 2016

Um Sonho de Outono

   Sob uma noite tardia eu durmo sentindo o aroma fresco do confidente sombrio, a consciência de uma lâmina sangrando em minha carne como verdades enraizadas sendo expostas num corte vermelho. Como um velho amigo que não tem mais nada a dizer, eu continuo à procura das partes onde meu corpo se desprendeu em cada momento incerto que pisei, sentindo minhas células mortas se fundirem com um lago de nuvens para um último mergulho. Através de rostos mau humorados, o toque frio da realidade me caça com sua fúria flamejante, uma raiva silenciosa tentando me ordenar novamente nos eixos da vida sem deixar vestígios, apenas para se tornar mais um nome sem rosto seguindo o curso de um mundo suicida. Eu me vejo fugindo dessa realidade como uma criança selvagem correndo com a alma defeituosa, o sangue escorrendo de suas imaginações e fazendo com que suas perdas se pareçam com um violino branco soando confissões melancólicas, mas de alguma forma estas palavras estão desaparecendo sobre a vela se exaurindo enquanto caminho pela estrada que tenho pavimentado para o grande espetáculo final. Quando eu abro minhas mãos vazias, as estrelas filmam os mesmos movimentos em câmera lenta, disperso na brisa, eu vivo em meu palácio de memórias, onde posso cair profundamente das ausentes pontes de promessas quebradas, embora tudo de que me lembre são pessoas e sombras irreconhecíveis como pedaços atrofiados do meu corpo interligando seus fardos e sonhos vaidosos. Os laços que me ligam à vida se desfazem como a voz de um afogado chorando, porém eu sempre esperei pela vaga promessa da chuva de outono... então você apareceu para falar as palavras que eu precisava ouvir e se tornar um abrigo para minha alma e meus segredos. Agora você caminha comigo na escuridão, despreocupados com o amanhã em uma pequena maravilha que envolve nossos corações, nós deitamos inquietos nessa cama de sussurros, mas você não pode ver além das nuvens do seu olho, pois meus apelos suaves não podem ser ouvidos nem o apego às minhas expectativas... entre nossos corpos imprensados, estamos à deriva, sem direção, para conter a onda do destino. Enquanto eu assisto em silêncio um estranho crescendo dentro de mim, os preciosos anos da minha juventude voam para céus vazios, mas você mantém suas visões dos dias melhores e persegue o tempo como se estivesse a poucas horas de viver o futuro. Rastejando para dentro da sua cabeça, eu consigo desmontar essa cena perfeita, mas como posso respirar quando o peso da minha partida desmoronar sobre você? Cada brilhante crepúsculo de nossas noites inesquecíveis fluem como um solo virgem desabrochando, vendo seus olhos de opala negra me encarando enquanto nossos corpos astrais se envolvem numa intensa sensação ilusória: seus braços abertos e seu coração apertado enfrentando o medo que deriva no escuro da noite. Neste truque de luz, eu faço uma pequena prece para você como pinturas da vida que gostamos de compartilhar, em braços fáceis protegendo sua pureza, mas acordando para te encontrar na minha mente enquanto seu corpo dorme, com a temperatura da sua pele subindo a quilômetros de distância. Por um momento, um sonho perfeito, soprando os sentimentos mais doces que já conhecemos e eternizando nossos nomes em nossos corações. E, com meus dedos bruxuleantes, eu conduzo sua alma com um sorriso, preenchendo suas veias com meu sangue negro à procura de um pouco de amor, vendo os holofotes tornarem sua raiva justificável quando as sombras desaparecem do outro lado da parede, mas logo chegará o dia... veja a febre correndo e bebendo tudo o que você tem, assistindo-a se mover sem rumo enquanto as trevas te cegam de arrependimento.

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