quinta-feira, 15 de novembro de 2018
O Caçador de Sonhos
Numa
existência vaga e vazia, o sofrimento me encontra novamente, sua dor é como a
ferida aberta de um animal esperando ser arrebatado, mas como um enxame de
moscas lambendo seu sangue, as línguas negras penetram em meus ouvidos, deixando-me surdo para as vozes humanas. Eu nunca mais poderei dormir calmamente, pois nada
pode me fazer esquecer os horrores que se escondem atrás das estrelas antigas
que me vigiam. Mas todo dia é uma desculpa, a consequência que desdobra meu
tempo e me paralisa com o desejo da morte. A fealdade eleva minha cabeça ao inferno, escurecendo minha alma como veneno sendo injetado nas minhas veias. Estou
perdendo minha fé e forçando-me por um caminho de reconhecimento, mas por trás
das cortinas há somente um pobre homem escondendo-se da luz do sol,
atravessando a sombra do seu rosto para que o sonho se realize. Os demônios
fantasiados são alimentados pelo som da sua voz, sugando o que restou da sua sanidade
para que a vida não seja desperdiçada. Como um martelo quebrando seus dentes, a
podridão se espalha pelo seu corpo, destruindo todas as facetas criadas pelos
anos de hipocrisia. Isso me assombra, por que não sei quem eu sou, tão pouco quem
eu era – esse impulso repetitivo que não posso fingir sem um decreto. Mas as
pessoas normais não agem desse jeito? Isso poderia servir como um filtro para
meu cérebro, comprando e vendendo a mesma dor dos vícios da sociedade. Contudo,
até os humanos me abandonaram, e meus amigos me veem como um estranho, pois minhas
palavras se tornaram sem valor, minhas ações como uma navalha em meu próprio
pulso, e eu já não posso mais encarar o dia, sufocado em minha máscara enquanto
perco minha fisionomia. Ai de mim! Que coberto pela escuridão achou-se moradia,
e em todos esses anos apenas uma luz brilhou em meus olhos, arrefecendo meu
coração com ar quente, esforçadamente intimado pelos sonhos vazios que
desapontava minhas expectativas. Agora tudo o que eu sentia por dentro está
morto, todos aqueles sentimentos perfeitos apagados como cinzas de cigarro, sem
nenhuma vítima para meu prazer perverso. Minha moral foi ensanguentada como
porcos banhando em lições imorais sujas e implorando pelo mais imundo dos
pecados terrestres, porém, enquanto eu fujo cegamente do que é real, eu
cubro meus olhos para não olhar o arame farpado que me separa de você, pois na
noite escura surgem prazeres, levando-me a escrever cartas anônimas com saudade
e amargura. Pare de procurar uma razão e reflita: você consegue ver a sombra deitada, enquanto
as flores dormem em um mundo completamente solitário? As velhas e poderosas
árvores nos observam de onde os antigos pais encontravam sua paz, e aonde os
pensamentos de tristeza conduziam a vontade de chamar pela chuva, formando
nuvens escuras movidas pelo desejo sinfônico de curar o mundo. Essa serenidade
vinha como passos invisíveis na neve ou como pássaros voando na geada
noturna, uma sensibilidade que eu sentia apenas quando estava com você, vivendo
em uma ilha sem nome, onde mergulhávamos profundamente no anseio dos nossos
corações. Parece ontem quando você estava aqui e tudo era tão perfeito,
a luz do sol brilhava nos prédios como um espelho de cristal, e eu saltitava feito
uma criança despreocupada, sem perceber quando meu glamour sombrio nos conduziu
para a danação eterna.
quinta-feira, 11 de outubro de 2018
O Paraíso Perdido
Meu
aniversário passou como um intervalo entre duas vidas, vendo visões dos dias
negros imaculados, enquanto me sentia como um inverno viciado em chamas
definhando no que restou da minha sanidade. Enterrado de maneira superficial,
eu fui perdendo tudo o que realmente importava para mim, como se o universo
estivesse me preparando para algo maior. Lamentar não era uma escolha, pois os
faróis queimavam em minha direção como dez navalhas de luz cravadas no meu
peito. As sombras na areia mostravam um caminho preparado para mim, um enredo
selvagem em um pó de ouro, afundando meus pés no desconhecido. Mas o diabo
tinha roubado a chave com sua beleza disfarçada, cada dia sua respiração aumentava
no meu pescoço, dizendo que no final nada poderia me livrar da maldição. Houve um
tempo de silêncio onde eu pude sentir os diferentes ciclos da natureza,
flutuando em uma torrente de tristeza como uma sucata de admiração, mas eu
nunca poderia ser preenchido novamente, por que quando você se foi, rasa de
tudo, eu desvaneci como vidro quebrado, ansiando realizações que nunca passaram
de ilusões. Agora eu sou apenas um fantasma vagando pelo seu quarto, esperando
encontrar o que um dia nunca me pertenceu. Faça-me acreditar que isso é real,
pois eu perdi você neste lugar de pesadelos que gritam na minha cabeça, vendo
bailarinos sem rosto dançando ao meu redor e te cobrindo no palco do desprezo. Eu
levanto minhas mãos e estou manchado de escuridão, deteriorando por fora como um
cadáver polindo os próprios ossos, consumido pela tela de fumaça que te
transformou em lembranças. Você era minha fruta favorita, pois seu sabor não
era sentido pela boca, mas pela sensação de ser pensado por você – uma energia
que fluía da sua mente para a minha. Quando seus pensamentos se ligavam aos
meus, bastariam poucas palavras para você me ter por completo, por que meu
corpo sempre se arrepiava com a nossa conexão astral. Cada pequeno segundo era
uma eternidade com você, pois cada segundo valia mais do que uma vida inteira
sem você. Eu achei que nunca mais amaria novamente, até conhecer você, um sonho
de garota que eu sempre imaginei encontrar. Por que a vida real é tão teimosa
em nos dar quem mais combina conosco astrologicamente
e nos completa infinitamente? Nós tínhamos tudo e não precisávamos de
mais nada: é difícil acreditar que fomos amantes queimados vivos por nossas
vontades. Se eu dissesse adeus, seria apenas um obrigado pelo que você tem me
dado, mas se o inesperado nos unisse, eu estaria agradecido por você me amar. Nosso
navio tem naufragado através da fantasia, mas esta não é a nossa bela memória
do que vivenciamos juntos? Quando cortamos a névoa da vergonha, as nuvens se
abrem e ainda enxergamos o paraíso que construímos juntos... está lá, esperando
por nós, um lugar que podemos encontrar nas profundezas das nossas mentes. Esqueça
o que fizemos, mas proteja o que construímos, por que o dom que perde seu
sentido nunca foi percebido na realidade.
segunda-feira, 1 de outubro de 2018
A Grande Cerimônia
quinta-feira, 16 de agosto de 2018
O Amante Astral
Entediada e sozinha, uma mulher vê formas caminhando pelo quarto, mas o lugar para
onde deseja ir só existe na sua cabeça. De olhos fechados, ela pode ser
quem quiser, pois não há limites para sua imaginação: seus olhos esmaltados de
verde e seus cabelos rubros como o entardecer se misturam com o negrume dos
pensamentos, formando pequenas dobras em sua mente, até a realidade ser
descartada com um suspiro. Os ruídos da casa desaparecem e o calor arrefece o
ambiente, mas com um truque de luz, ela pisca os olhos como um
ator roubando a cena diante de todos os pensamentos que luta para esconder. O
tempo para lá dentro, mas lá fora é apenas um instante, ainda assim, o mundo se
torna um jardim perfumado, onde todas as razões para continuar invadem seus
ouvidos com um sorriso de prazer. A noite fria e úmida se torna uma silhueta
imaginária, mas ela percebe que está flutuando, quando algo escapa dos seus
dedos, embora não saiba o que é. Com luzes azuis-celestes, seu corpo é puxado
por uma força ternamente pulsante como uma melodia que a carrega para céus
distantes. Branca como uma nuvem de algodão, a pureza reluz em sua pele, mas
quem poderia salvá-la dos seus desejos mais profundos? Ela sabia que um dia deveria
enfrentar aquele que visitava seus sonhos de adolescência, pois agora é uma
mulher-feita, não mais uma garotinha que nada e se afoga, mas pronta para mergulhar nos mares profundos da mente humana. A fragrância que
sentia era natural como cheiro de pele, e quanto mais ela se aproximava, mais
uma luz queimava por dentro do seu santo éden. Uma força mágica a submergia na
estranha sensação de perigo, desejando experimentar um pedaço do proibido em
seu íntimo, só mais um beijo da sombra em sua alma, um sentimento além do que
seus olhos podem ver ou palavras podem dizer, apenas a certeza de ser acolhida pelo
anseio das batidas do seu coração. Então, por que você hesita, se ela é você
e a sombra sou eu? Aqui, a noite nunca acaba, mas por que você está chorando? Eu
vejo lágrimas escorrendo do seu coração, enquanto ouço as batidas
desaparecendo, e tudo que almejo é fazer com que volte a descompassar o ritmo de
antes, quando sua voz era valorizada e suas mãos tocavam a música na sintonia
do amor. Como um rastro sangrento secando na areia, você abandonou seus dons,
mas nossa busca incessante está apenas começando... você consegue ouvir esta
melodia suave de um estranho mistério nos envolvendo, enquanto as estrelas
brilham com o seu destino? Talvez você esteja muito surda para ouvir o som
invisível das minhas palavras, mas o viajante sempre tem uma breve passagem
como uma estrela cadente, desenhando uma forma perfeita para abrir seus olhos e
você enxergar a árvore virgem que está nascendo em seu coração. Eu me sinto
feliz só em saber que você existe, em lembrar-se de nossas aventuras quando
você bebeu o suco da minha essência ou tornou-se poeira estelar, fundindo-se ao
que restou de mim. Deixe que minha mão fria toque seu íntimo e minha respiração
quente rasteje pelo seu pescoço, por que no final apenas fragmentos permanecem,
e o amor mortal não é suficiente para preencher o vazio da existência. Uma vez
que nossos gritos atinjam o alto, nossos corações danificados crescerão
distantes, absorvendo a verdade que me faz acreditar que você seja a tão esperada
quintessência. Sob o olhar do vigia, você não precisa mais se esconder, pois quando
usamos a misericórdia como isca, há uma chance de compensar e varrer as cinzas
que esperamos como prêmio.
sexta-feira, 10 de agosto de 2018
A Palavra Original
domingo, 3 de junho de 2018
Selvagem
Escondido
da vista, um cão raivoso corre cegamente pela floresta, seus latidos são como
vogais macias que imploram por uma abordagem, mas ele se apressa para chegar onde reside
sua identidade secreta. Agora um homem surge do covil: é muito difícil manter-se
de pé naquele corpo esguio, mas alguém o espera em casa e seu atraso poderia
levantar suspeitas. Alimentando a noite, ele retorna pelo mesmo caminho por
onde veio, pois é mais fácil enganar uma pessoa estando próximo dela do que distante.
Enquanto atravessa as divisões lunares, um pássaro preto se senta, possivelmente o único que sabe quem ele é, mas quem compreenderia o
crocitar de um corvo? Inclinado para frente, ele ignora o olhar acusador e retira
as mãos dos bolsos, desejando que suas unhas estivessem limpas. O homem não tem
mais aquela camada de pelos para protegê-lo do frio, e a lufada de ar fresco
que penetra em seus ossos o faz enrijecer, quase como se mergulhasse em uma
piscina de gelo. Nu como em seu nascimento, ele não sabe onde foram parar suas
roupas, mas ninguém consegue vê-lo perambulando entre os arbustos da cidade
apagada. Ele vê moças estrangeiras conversando com homens perigosos, as quais
jazem em lençóis mortos antes do amanhecer, pois seus lábios vermelhos também atraem
predadores. O caminho está forrado com árvores, ele sente a selvagem respiração
do vento, enquanto uma pequena folha escova seu ombro e reflete a sombra dos
raios da lua em suas transbordantes recordações, memórias que chegam como um
murmúrio do passado e invadem sua visão, porém como a vidraça de uma janela, ele fragmenta seus pensamentos, apenas ouvindo os passos daquelas pessoas
ressonando na estrada. As estrelas se tornam brilhos estranhos na escuridão, e
seu instinto sofre intensivamente, vendo sombras em movimento ao longo dos
gritos de lares destruídos, uma obscena ruptura do silêncio da meia-noite, onde
o sangue goteja de lábios gananciosos e atrai mentes violentas, congelando
cadáveres com o pulso estrangulador da morte. O odor das trevas se mistura com
a segurança que as famílias acreditam ter, enquanto estremecem e seus pés
flutuam, dormindo sem ouvir os demônios que espreitam ao derredor e assistem
suas vidas patéticas. Perto de casa, o silêncio se torna uma voz lamuriosa,
ondas oscilantes emaranhando-se e agredindo sua mente, por onde a eternidade do
tempo está passando infinitamente nos confins da sua vida sem sentido. A
colisão parece programada, carregando suas cicatrizes como lágrimas brancas que
escorrem secas pela ventania. Lá, num espaço tragado pelo tédio, um amor
cego o espera com ramos dimensionais que atravessam sua liberdade. Com um
doloroso vazio, o homem galopa pela janela e sua esposa está deitada, suas
pálpebras piscam e se abrem lentamente, mas seu sorriso é como uma lâmpada
torta. Seu cheiro de flores o puxa como imã para cama, e ela se embala
gentilmente em seus braços, sem desconfiança, pois o amor é tudo que transborda de seus
lábios abertos. A brisa noturna e o olho da lua espreitam pela janela, mas a
voz da tentação sussurra em seu ouvido, vendo as sombras dos galhos se transmutarem
em diferentes formas como asas invisíveis na parede. O mundo lá fora se
desmorona e o silêncio é engolido pelos gemidos da sua amada, enquanto sua
tristeza é transformada em bondade.
terça-feira, 22 de maio de 2018
Pássaro Azul
Por
onde eu ando, meu corpo sente seu campo magnético, suas pegadas delineiam meu
caminho, tornando o ar mais leve como céus azuis de dor. Enquanto a lua gelada
ilumina a terra, eu afundo meu silêncio onde a lama sangrenta cobre meus pés, mas
posso sentir o toque profano da sua visita, passos delicados como o andar fino
de um doce amante, trazendo benefícios celestes em seu olhar inocente, embora
por trás da pureza você esconda um pequeno sorriso assustador. Quando eu olho
para você, percebo que sua beleza vale mais do que todo ouro do mundo, mas que
não posso ter nenhum dos dois agora. Eu planejei, a partir daqui, um sonho
vivido ao seu lado, até notar que minhas palavras não tinham mais poder sobre
você. As imensuráveis promessas que fiz, de que elas valem após sua partida? As
lembranças são tudo o que guardo comigo como um homem que é exilado da sua
terra natal e se contenta com uma nova vida medíocre. Ah, se eu pudesse...
apenas mais uma vez, olhar as pérolas radiantes do teu olhar, sentir o cheiro
gelado da tua aspereza, ouvir a voz descompassada dos teus lábios, devolver aquela
rosquinha que você me deu um dia antes de brigarmos e tudo mudar para sempre.
Ó, aurora, maldito sou eu e as palavras que saíram da minha boca, por que elas
te puxaram para um céu distante, onde nem a torre mais alta seria suficiente
para alcançar o teu perdão. Um começo feliz, um triste fim, não é sempre assim?
Para cada minuto da história, nossas vontades são quebradas e curvadas, nossos
registros mantidos em porões escuros, nossas vidas decididas por escolhas
imaturas. Como um tapa de veludo, eu rodopiei mil vezes até aceitar que a cena
não é mais o que costumava ser: você cresceu e só deus sabe o quão bela você se
tornou, por que a beleza não é só aquilo que mostramos por fora. Os anos se
passaram para você, não para mim, pois eu fiquei preso nesta separação cruel
esperando pelo seu apelo, mas toda vez que eu ouço uma mulher chorando, eu me
lembro de você, do que eu causei em você... palavras ferem mais do que um
hematoma... palavras... isso é tudo o
que eu tenho? Por quanto tempo eu fiquei aqui, escrevendo e esperando, enquanto
a vida passava? Como um frágil covarde, eu via o chão murcho sob meus pés, e
fui mantido neste lugar por mais tempo do que meus próprios anos, dando fôlego
a uma presença escura que me acompanha como minha sombra, enquanto a loucura tentava me
guiar para a borda do abismo. Você ainda se lembra das suas primeiras palavras?
Aquelas sobre o negro divino, onde você disse que havia um espinho por dentro
evaporando como um fluído sem prefixação... ora, se o mesmo deus que nos uniu
ainda planeja nosso reencontro, então eu rezo para que esse espinho ainda
exista dentro de você, por que eu jamais amarei alguém como amo você, jamais
olharei para alguém como olho para você, jamais escreverei para alguém como
escrevo para você. Esse sentimento está além da minha compreensão, além do espaço
e do tempo, além da vida e da morte. Quantas vezes mais eu me despedirei de
você, até aceitar que nunca esteve aqui? Como um pássaro impetuoso, você voa
para bem longe, mas eu permaneço acenando do meu túmulo.
segunda-feira, 1 de janeiro de 2018
O Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças
Ajoelhado
diante do altar, a cruz vertida se move para baixo como um crisol entre dois
candelabros, novamente ouvindo aquela melodia dizendo para não abandonar o
símbolo do seu criador, mas para falar destas coisas é preciso sair dos eixos da
luz para que minha alma não se torne indigna da sua presença. Hoje à noite o
círculo está encontrando-se outra vez e sete irmãos estão aqui juntando suas
mãos, para que eu não venha a tropeçar. Pelo Senhor da Noite, nós nunca iremos quebrar o juramento que prestamos
esta noite, pois tu és o mestre que brilha na escuridão, um local profundo onde
os iluminados anseiam. Diante de ti, nós trazemos esta bela alma negra que, ao
mostrá-la para vossos irmãos, seremos todos unos com ela, assim como somos
todos unos contigo. Assim vos peço que façam o devido silêncio, pois o que irei
contar esta noite poderá ser verdade ou a pior de todas as mentiras que já
ouviram. Vocês sabem, é preciso esconder dos olhos que não querem ver. No
princípio, o seu choro ecoava no relento, seguindo a chuva que se esgueirava
pelos destroços do teto em pedaços, pingando suavemente sobre o que restou das
suas lembranças deste dia. Acordando em uma nova vida, ela sabia que estava
viva por algum meio sinistro, mas em troca havia recebido um lar entre aqueles
que conheciam os segredos da sua existência. Assim, tão nova quanto às estações
do outono, ela foi iniciada nos caminhos das florestas elísias, onde o
exuberante lírio do campo exalava sua lição de vida: de que tudo o que fosse
aprendido ali devesse ser mantido em sigilo. No limiar da sua juventude, todos
os aprendizados geravam luz sobre os fantasmas do seu passado, o que lhe fez
dar algum sentido ao seu envolvimento, embora nem de perto pudesse apaziguar o
ódio do seu nascimento, pois sem o amor devido dos pais, ela foi abandonada em
morte e resgatada para dar lugar ao espírito que lhe trouxe de volta à vida, o
qual a identidade não pode ser revelada, mas que divide um espaço em seu corpo
como prova de um acordo mútuo. Impulsionada pelo veneno do ódio, ela abraçou a
magia como sua amiga mais poderosa, embora mais tarde esta pudesse se tornar sua
pior inimiga. Os seus esforços eram medíocres diante da força que dominava seu
corpo, o que lhe fez aceitar alguns favores, distorcendo a realidade das suas
ações com seu indiscutível poder de direito. Aos poucos, ela foi crescendo e já
não aguentava mais a ignorância alheia, pois suas palavras eram de uma linhagem
com diversas línguas, contemplando um mundo mais sólido e real. Aquilo infestava
sua mente, corpo e espírito como uma obsessão que alimentava sua felicidade
ilusória, mas até a morte tem um contrato sobre a vida nas entrelinhas, pois
tudo o que antes era incerto, agora era previsível, o que tornava seu
conhecimento um fardo de responsabilidade. Esta impulsão magistral de educação diabólica
parecia lhe trazer liberdade, onde o oposto da inocência abria o caminho para a
inteligência, mas preto como piche e sem os raios do sol, quanto mais ela se
aprofundava, mais o fedor de carne podre tomava conta da sua respiração, pois
cada dia parecia como uma noite infinita, ouvindo nenhuma voz senão a sua
própria, como se uma força de necromancia estivesse por trás de tudo isso... a vida
perdeu para sempre sua inocência e a vasta solidão a encobertou de medo, embora
um grande castigo eventualmente viesse sobre o culpado, nunca facilmente
satisfeito, por se aproveitar da amargura do seu coração. Mas eu percebo que o
desafio e a resistência a fizeram uma mulher mais forte, tendo
algum ar fresco para respirar e desviar-se de si mesma para um cativeiro
mental, numa ternura integra que a acompanhou sem promessas preparadas, apenas
aceitando a obrigação que estava sobre seus ombros. Meus queridos
irmãos, estas foram as palavras que me foram reveladas, e por ela eu daria
todo meu amor e esperança, mesmo que a angústia formasse um espiral no meu
intestino como uma lombriga faminta. A verdade escondida sempre prevalece, mas
até que eu a descubra peço-vos que me protejam de todo mal e de toda maldição
lançada sobre mim, por que dando à ela uma saída, eu me torno um participante
dos mistérios avessos, estagnado em águas mortas como quem espera para ser puxado
para baixo. Veja, um novo ano se aproxima e nós aguardamos por sua chegada ao berço
da próxima geração! Através dos anos de sacrifício, eu nunca havia conhecido
alguém como ela, a quem tenho todo afeto e respeito do mundo, mas minha
consciência superior posiciona-se desafiadoramente, orgulhosa e rígida,
insistindo para que eu me afaste enquanto é tempo. Haverá algo por trás do seu
disfarce mortal? Essas palavras desenhadas em água tornaram-se nosso legado de
fantasias, mas se seus segredos me fossem revelados, o mundo se transformaria em
uma percepção além do que já estou acostumado a ver, pois o que é pior que não
saber? Pobre alma assassina, como eu invejo sua falta de justificação quando a
minha é tão sincera!
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