Com os campos deixados sozinhos, os corvos escurecem os
céus. Como o reflexo de um vidro rachado, você se vê em muitos lugares, mas
sabe que tem de estar em algum lugar em algum momento. Você tem desejo, mas só
consegue engatinhar. O frenesi toma conta de toda sua vida, e você é pregado na
roda que viaja pelo mundo. Olhando por cima do meu ombro por essa estrada que se
segue, o que pareceu alguma vez importar agora é apenas poeira sob meus pés. O
silêncio recorda minha vida incompleta e tudo o que resta são essas cicatrizes
para me lembrar de todos os dias que joguei fora. São as barras que me confinam
a um passado que não posso escapar, pois as palavras não foram ditas agora,
elas são lembradas, cada segundo que morre em uma silenciosa morte sem luto tentando
conduzir-me sozinho por um caminho da cor do desprezo. Eu percebo que perdi
mais um dia quando cegado pelo ódio que queima em mim, meus olhos veem fixamente
através das veias de gelo a minha transformação com o veneno interno, sentindo
um impulso ser mandado à frequência do meu cérebro. Agora eu sou forçado a
encarar a verdade ignorando a presença dela como se não existisse, mas eu
preciso me manter em movimento, pois o suor continua escorrendo com o diabo nas
minhas costas, arrastando o mundo como crateras de cicatrizes se abrindo para
engolir a humanidade. No rádio, uma voz graceja o discurso de que ninguém sabe
o que o futuro nos reserva, afirmando que a vida é apenas o dia que se
desenrola. Na tevê, o pregador prega como um rato em um navio afundado esticando-se
para salvar sua pele. Os jornais propagam uma falsa sinceridade que faz você se
emocionar como os milhões que eles manipulam. Nas escolas os professores
ensinam sobre os pecados do passado, culpando os outros pelos problemas do
agora. E, em algum lugar, você ouve o som de uma criança chorando, contando as
lágrimas do riso do pai bêbado. Muitos escravos morrem por tortura e dor, mas
há também aqueles que morrem por trabalho, com o medo os mantendo na linha até
descobrirem que suas vidas são uma mentira. Os muros do mundo passaram a ser
construídos por corpos e mentes vazias, pois a verdade que é descarada é a mais
ignorada por todos. Sem testemunha sobre essas palavras que descem e morrem, eu
não posso compreender um mundo assim tão frio e cruel, porém eu continuo me
guiando para viver esta mentira... marcando um esmo como um barco no oceano
sem localização, com ondas de dúvidas me espancando e afogando minha alma, estas
distrações que mantém meu pensamento longe do por que estou vivo. O que me
resta? Eu poderia puxar a alavanca e orquestrar um sonho no refluxo da maré ou imaginar um propósito para viver e seguir o seu curso para no fim ser esquecido
tão rápido quanto surgiu. Eu não serei mais o seu mártir, vivendo
na imundície de um mundo insensível, dormindo numa cama de fracasso enquanto a
dignidade das minhas lembranças desaparecem. Eu me recuso a aceitar o papel que
você me deu para jogar em seu jogo doentio, sem vergonha, sem orgulho e sem fé, a sua alma é um sol poente. Mas quando os demônios começam a chamar, eu preciso
de você para me salvar. Negro como a meia-noite, você é como uma tatuagem ruim
da qual não posso me livrar, não importa o que eu faça, você nunca vai embora dos
meus pensamentos. Eu tentei de tudo. Eu dancei com os mortos e dei o melhor de
mim para aprender a sua lição, mas não importa como nós tentamos, no final é sempre sofrimento. Não há nenhuma boa maneira de morrer, não há regras para se
viver. Eu não posso mais fugir dos meus sentimentos por você. Você é a essência de tudo. É o próximo que amamos em nós mesmos. É o assassino em mim.
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