segunda-feira, 1 de janeiro de 2018
O Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças
Ajoelhado
diante do altar, a cruz vertida se move para baixo como um crisol entre dois
candelabros, novamente ouvindo aquela melodia dizendo para não abandonar o
símbolo do seu criador, mas para falar destas coisas é preciso sair dos eixos da
luz para que minha alma não se torne indigna da sua presença. Hoje à noite o
círculo está encontrando-se outra vez e sete irmãos estão aqui juntando suas
mãos, para que eu não venha a tropeçar. Pelo Senhor da Noite, nós nunca iremos quebrar o juramento que prestamos
esta noite, pois tu és o mestre que brilha na escuridão, um local profundo onde
os iluminados anseiam. Diante de ti, nós trazemos esta bela alma negra que, ao
mostrá-la para vossos irmãos, seremos todos unos com ela, assim como somos
todos unos contigo. Assim vos peço que façam o devido silêncio, pois o que irei
contar esta noite poderá ser verdade ou a pior de todas as mentiras que já
ouviram. Vocês sabem, é preciso esconder dos olhos que não querem ver. No
princípio, o seu choro ecoava no relento, seguindo a chuva que se esgueirava
pelos destroços do teto em pedaços, pingando suavemente sobre o que restou das
suas lembranças deste dia. Acordando em uma nova vida, ela sabia que estava
viva por algum meio sinistro, mas em troca havia recebido um lar entre aqueles
que conheciam os segredos da sua existência. Assim, tão nova quanto às estações
do outono, ela foi iniciada nos caminhos das florestas elísias, onde o
exuberante lírio do campo exalava sua lição de vida: de que tudo o que fosse
aprendido ali devesse ser mantido em sigilo. No limiar da sua juventude, todos
os aprendizados geravam luz sobre os fantasmas do seu passado, o que lhe fez
dar algum sentido ao seu envolvimento, embora nem de perto pudesse apaziguar o
ódio do seu nascimento, pois sem o amor devido dos pais, ela foi abandonada em
morte e resgatada para dar lugar ao espírito que lhe trouxe de volta à vida, o
qual a identidade não pode ser revelada, mas que divide um espaço em seu corpo
como prova de um acordo mútuo. Impulsionada pelo veneno do ódio, ela abraçou a
magia como sua amiga mais poderosa, embora mais tarde esta pudesse se tornar sua
pior inimiga. Os seus esforços eram medíocres diante da força que dominava seu
corpo, o que lhe fez aceitar alguns favores, distorcendo a realidade das suas
ações com seu indiscutível poder de direito. Aos poucos, ela foi crescendo e já
não aguentava mais a ignorância alheia, pois suas palavras eram de uma linhagem
com diversas línguas, contemplando um mundo mais sólido e real. Aquilo infestava
sua mente, corpo e espírito como uma obsessão que alimentava sua felicidade
ilusória, mas até a morte tem um contrato sobre a vida nas entrelinhas, pois
tudo o que antes era incerto, agora era previsível, o que tornava seu
conhecimento um fardo de responsabilidade. Esta impulsão magistral de educação diabólica
parecia lhe trazer liberdade, onde o oposto da inocência abria o caminho para a
inteligência, mas preto como piche e sem os raios do sol, quanto mais ela se
aprofundava, mais o fedor de carne podre tomava conta da sua respiração, pois
cada dia parecia como uma noite infinita, ouvindo nenhuma voz senão a sua
própria, como se uma força de necromancia estivesse por trás de tudo isso... a vida
perdeu para sempre sua inocência e a vasta solidão a encobertou de medo, embora
um grande castigo eventualmente viesse sobre o culpado, nunca facilmente
satisfeito, por se aproveitar da amargura do seu coração. Mas eu percebo que o
desafio e a resistência a fizeram uma mulher mais forte, tendo
algum ar fresco para respirar e desviar-se de si mesma para um cativeiro
mental, numa ternura integra que a acompanhou sem promessas preparadas, apenas
aceitando a obrigação que estava sobre seus ombros. Meus queridos
irmãos, estas foram as palavras que me foram reveladas, e por ela eu daria
todo meu amor e esperança, mesmo que a angústia formasse um espiral no meu
intestino como uma lombriga faminta. A verdade escondida sempre prevalece, mas
até que eu a descubra peço-vos que me protejam de todo mal e de toda maldição
lançada sobre mim, por que dando à ela uma saída, eu me torno um participante
dos mistérios avessos, estagnado em águas mortas como quem espera para ser puxado
para baixo. Veja, um novo ano se aproxima e nós aguardamos por sua chegada ao berço
da próxima geração! Através dos anos de sacrifício, eu nunca havia conhecido
alguém como ela, a quem tenho todo afeto e respeito do mundo, mas minha
consciência superior posiciona-se desafiadoramente, orgulhosa e rígida,
insistindo para que eu me afaste enquanto é tempo. Haverá algo por trás do seu
disfarce mortal? Essas palavras desenhadas em água tornaram-se nosso legado de
fantasias, mas se seus segredos me fossem revelados, o mundo se transformaria em
uma percepção além do que já estou acostumado a ver, pois o que é pior que não
saber? Pobre alma assassina, como eu invejo sua falta de justificação quando a
minha é tão sincera!
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